ESBOÇO Nº 1
A) INTRODUÇÃO AO TRIMESTRE
Estamos iniciando o terceiro ano letivo deste currículo da Escola Bíblica Dominical, agradecendo a Deus por ainda podermos, em liberdade de culto e de crença, publicamente estudarmos a Palavra de Deus, ensinando enquanto evangelizamos, evangelizando enquanto ensinamos.
A Casa Publicadora das Assembleias de Deus escolheu como tema inaugural deste novo ano a Eclesiologia, ou seja, a doutrina bíblica sobre a Igreja, certamente para, depois de termos, no ano passado, estudado sobre a necessidade do avivamento espiritual, de termos relacionamentos familiares saudáveis, de sabermos como enfrentar o mundo e, por fim, da responsabilidade nossa com missões transculturais, debruçarmo-nos um pouco sobre o que é a Igreja, Igreja da qual fazemos parte.
A Igreja é o grande mistério, o segredo que Deus manteve desde antes da fundação do mundo (Ef.3:4-6) para só revelá-lo, por Seu Filho, em Cesareia de Filipe, na região norte de Israel, quando o Pai revelou a Pedro que Jesus era o Cristo, o Filho do Deus vivo.
Naquele exato instante, como que se tivesse uma senha, o Senhor Jesus, então, revela aos Seus discípulos que edificaria a Sua Igreja e que as portas do inferno não prevaleceriam contra ela, mas, que, para tanto, necessário seria que Ele sofresse e morresse pelos pecadores, mas que, ao terceiro dia, ressuscitaria (Mt.16:16-23).
Jesus, então, mostra que formaria um povo espiritual, que seria formado tanto por judeus quanto por gentios, povo que se reconciliaria com Deus por meio de Cristo e que faria a ligação da humanidade com Deus até o dia em que o mesmo Senhor viesse buscá-lo para com Ele morar para sempre na casa do Seu Pai (Ef.2:11-22; Jo.14:1-3).
A Igreja é este conjunto de pessoas que, tendo sido chamados para fora do mundo, tem a Jesus como seu fundamento (I Co.3:11) e cabeça (Ef.5:23), ou seja, Mestre e Senhor (Jo.13:13), vivendo como Ele viveu aqui sobre a Terra (I Co.11:1; I Pe.2:21), para que, assim como Ele, possa chegar ao trono nos céus (Hb.12:2. Ap.3:21).
Feliz foi o Cremos da Declaração de Fé das Assembleias de Deus que, de modo inovador, introduziu um item específico a respeito da Igreja, que não havia no Cremos originalmente publicado no jornal O Mensageiro da Paz a partir da década de 1960 por iniciativa do saudoso pastor Alcebíades Pereira Vasconcelos (1914-1988).
Diz o referido item: “[CREMOS] Na Igreja, que é o corpo de Cristo, coluna e firmeza da verdade, una, santa e universal assembleia dos fiéis remidos de todas as eras e todos os lugares, chamados do mundo pelo Espírito Santo para seguir a Cristo e adorar a Deus (I Co.12:27; Jo.4:23; I Tm.3:15; Hb.12:23; Ap.22:17).”
A Igreja é, antes de tudo, um grupo de pessoas, uma “assembleia”. A palavra grega utilizada é “ekklesia” (εκκλησία), cujo significado é precisamente o de “assembleia”, grupo de pessoas que costumava se reunir nas cidades gregas para tomar as decisões relacionadas com a vida pública.
Jesus, ao denominar este povo de “Sua Igreja”, estava a nos mostrar que se tratava de um conjunto de pessoas que foram chamadas por Ele para que se unissem a Ele e tomasse as decisões sob Seu comando, saindo do lugar onde estavam para manter esta união, união que seria permanente, pois o Senhor Jesus sempre fez questão de lembrar aos discípulos que eles deveriam permanecer, seja na sua Palavra (Jo.8:31), seja no Seu amor (Jo.15:9,10).
É por isto que a Igreja se distingue dos outros povos existentes na Terra (I Co.10:32), sendo “de Jesus”, “corpo de Cristo”, “coluna e firmeza da verdade”, una, santa e universal.
São os “chamados para fora” (Pv.1:20,21), pois “ekklesia” tem este significado etimológico: “ek” – para fora”; “klesia” – chamados.
A Igreja se forma porque há pessoas que atendem ao chamado, que respondem positivamente ao convite da salvação, tomando a atitude de abandonar o lugar onde estão, o mundo e o pecado, crendo na mensagem trazida por Deus – o Evangelho da salvação (Ef.1:13), o Evangelho da graça de Deus (At. 20:24).
Uma vez saídos do mundo, estes” chamados para fora” passam a seguir a Cristo (Mt.16:24; Mc.8:34; Lc.9:23; Jo.12:26) e a adorar a Deus, pois seguir as pisadas de Jesus nada mais é que fazer a vontade divina (Jo.9:4; 12:49; 13:20).
O título do trimestre enfatiza uma das imagens que as Escrituras se utilizam para se referir à Igreja e que é mencionada, também, com destaque no já mencionado item 8 do Cremos da Declaração de Fé das Assembleias de Deus – “o corpo de Cristo”.
Esta imagem, utilizada pelo apóstolo Paulo tanto na primeira carta aos coríntios (I Co.12:27), quanto na carta aos efésios (Ef.4:12), é de extrema riqueza e profundidade.
Por primeiro, revela que há uma continuidade entre Cristo e a Igreja. Não foi à toa que a Igreja só foi revelada depois que o Pai revelou quem era o Cristo. Não há Igreja sem Jesus.
Ao se dizer que a Igreja é “o corpo de Cristo”, está a dizer que é a continuação, o prolongamento de Cristo na Terra por intermédio deste povo e é bem por isso que a Igreja serve de ligação entre os homens e Deus, entre o céu e a terra, porque Cristo é o mediador entre Deus e os homens (I Tm.2:5), não sendo a Igreja senão o Seu corpo.
Mas, quando se diz que a Igreja é o “corpo”, imediatamente a Bíblia nos revela que Cristo é a cabeça deste corpo, assim como seu Salvador (Ef.1:22; 5:23), a nos mostrar que os integrantes da Igreja são servos do Senhor Jesus, que Ele é a única cabeça deste corpo.
A Igreja é de Jesus e, portanto, não tem qualquer guarida todo e qualquer ensinamento que transfira de Jesus para algum homem o comando da Igreja, como fazem os romanistas na doutrina do Papado ou os defensores da falsa doutrina da “cobertura apostólica” ou “cobertura espiritual”.
Mas a ideia de corpo também mostra que a Igreja é, a um só tempo, una e diversa. Assim como o corpo humano é um só, e cada um de nós tem apenas um corpo, também temos, neste corpo, vários órgãos, tecidos, células, que exercem diferentes funções e que dependem umas das outras para que o corpo continue a viver.
A Igreja, também, é um único corpo, ela é única, as Escrituras falam “do corpo de Cristo”, não se corpos, mas sabemos todos que, nesta unidade, há uma diversidade de operações, funções, ministérios, dons, inexistindo uma uniformidade, pois como afirma o apóstolo Paulo: “Se todo o
corpo fosse olho, onde estaria o ouvido? Se todo fosse ouvido, onde estaria o olfato? Mas agora Deus colocou os membros no corpo, cada um deles como quis. E se todos fossem um só membro, onde estaria o corpo? Agora, pois, há muitos membros, mas um corpo” (I Co.12:17-20).
O subtítulo do trimestre mostra o itinerário que teremos neste trimestre, estudando este “corpo de Cristo”, refletindo sobre a sua origem (lição 1), a sua natureza (lições 2 a 4) e sua missão (lições 5 a 12), com uma lição conclusiva (lição 13).
O primeiro bloco do trimestre analisará a origem da Igreja, envolvendo a primeira lição.
O segundo bloco do trimestre analisará a natureza da Igreja, abrangendo as lições 2 a 4.
O terceiro bloco do trimestre analisará a missão da Igreja, abrangendo as lições 5 a 9.
O quarto bloco do trimestre analisará a Igreja com relação ao seu relacionamento com Deus, seja na questão do poder de Deus, da Palavra e da própria vida de santidade, abrangendo as lições 10 a 13.
A capa do trimestre mostra-nos pessoas que, em movimento, se reúnem, formando uma cruz.
Esta figura mostra-nos, por primeiro, que a Igreja é, como vimos, uma reunião de pessoas, uma assembleia.
O fato de estas pessoas estarem em movimento, mostra-nos que a Igreja é um organismo vivo, é o corpo de Cristo, corpo que está vivo e viverá para sempre (Ap.1:18) e uma prova de sua vida é que as pessoas estão vindo ao seu encontro, ou seja, a igreja continua a chamar as pessoas para a salvação.
As pessoas se reúnem, estão unidas, mas ocupam diferentes espaços, diferentes lugares, a nos mostrar que ela é um corpo, ou seja, embora seja una, é também diversa, um corpo mas muitos membros.
Por fim, todas, ao se reunirem, formam a cruz, ou seja, têm a Jesus como cabeça e fundamento, como o centro de suas vidas. Todos ali estão por Ele e para Ele e somente a Ele rendem glória.
A Igreja é de Jesus e d’Ele só. Aleluia!
O comentarista deste trimestre é o pastor José Gonçalves, presidente das Assembleias de Deus em Água Branca/PI, presidente do Conselho de Doutrina da Convenção Estadual das Assembleias de Deus no Piauí e vice-presidente do Conselho de Apologética da Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil, sendo graduado em Teologia pelo Seminário Batista de Teresina/PI e em Filosofia pela Universidade Federal do Piauí e que já há alguns anos tem comentado as Lições Bíblicas.
Que ao término do trimestre, saibamos o que é a Igreja e aprendamos a dela ser membros.
B) LIÇÃO Nº 1 – A ORIGEM DA IGREJA
Planejada por Deus antes da fundação do mundo, a Igreja foi edificada por Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.
INTRODUÇÃO
-Teremos um trimestre temático, em que estudaremos uma das doutrinas fundamentais da Bíblia Sagrada: a Eclesiologia, a doutrina da Igreja.
-Planejada por Deus antes da fundação do mundo, a Igreja foi edificada por Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.
I– CONCEITOS DE IGREJA
-Neste primeiro trimestre de 2024, estaremos a estudar uma das doutrinas fundamentais das Escrituras Sagradas, a Eclesiologia, que é a doutrina da Igreja.
A Bíblia revela-nos que, com a vitória de Cristo sobre a morte e o inferno, forma-se um povo diferente, especial, zeloso e de boas obras, a saber, a Igreja. É esta Igreja que será o objeto do nosso estudo neste trimestre.
-A palavra “igreja” surge, pela vez primeira, nas Escrituras, no evangelho segundo Mateus (Mt.16:18), quando é declarada pelo próprio Jesus que, assim, revela o “mistério de Cristo”, como o apóstolo Paulo chamou a “igreja” na epístola aos efésios. É a palavra grega “ekklesia” (εκκλησια), cujo significado é “reunidos para fora”, “chamados para fora”.
-A palavra “ekklesia”, porém, já havia sido utilizada na Versão Grega do Antigo Testamento (a chamada Septuaginta) para traduzir a palavra hebraica “qahal” (קהל), que as nossas versões em língua portuguesa costumam registrar como “congregação”, nome pelo qual era conhecida a reunião do povo de Israel, principalmente no tempo da peregrinação no deserto, quando Moisés costumava chamar todo o povo para algumas reuniões solenes à frente do tabernáculo que, por isso mesmo, era denominada de “tenda da congregação” (Dt.9:10; Nm.10:1-3, ainda que nesta segunda passagem a palavra utilizada seja outra).
-Notamos, pois, de início, que a palavra “igreja” fala de uma “reunião”, ou seja, um grupo de pessoas. Igreja não é um indivíduo, não é uma pessoa solitária, mas, sim, um grupo de pessoas, um conjunto de pessoas.
-Desta forma, ficamos sabendo, já pela etimologia da palavra, que a salvação proporcionada por Jesus Cristo cria um novo grupo de pessoas, um novo povo.
-Não se pode, pois, biblicamente falando, ser salvo e permanecer isolado, solitário na vida sobre a face da Terra. Este novo povo, esta “igreja”, vem, portanto, realizar, concretizar aquilo que Israel, a “propriedade peculiar de Deus dentre todos os povos” (Ex.19:5,6) era apenas uma figura, um símbolo, uma sombra (Hb.10:1).
-Não é por outro motivo que o apóstolo Paulo, ao falar sobre a salvação, diz que todos os salvos são “batizados em um Espírito, formando um corpo, quer judeus, quer gregos, quer servos, quer livres e todos temos bebido de um Espírito” (I Co.12:13), ou seja, a conversão vem indissociavelmente acompanhada de uma “imersão”, de um “mergulho” em um corpo, somos inseridos num organismo, passando a ser membros uns dos outros (Rm.12:5).
-Mas “igreja” não é apenas uma “reunião”, mas é o conjunto dos “reunidos para fora”, ou seja, daqueles que foram chamados, convocados, para sair do lugar onde estavam, da sua habitação, como, aliás, acontecia toda vez que Moisés tocava as duas trombetas de prata no deserto, sinal de que todo o povo deveria sair das suas habitações e comparecer até a frente do tabernáculo.
-A “igreja”, pois, não é um povo que se formou por vontade própria, mas que foi resultado de um chamado, de uma ação divina.
Por isso, Jesus diz que edificaria a Sua igreja e o apóstolo Paulo a denomina de “lavoura de Deus” e “edifício de Deus” (I Co.3:9). A igreja não é uma criação humana, mas, sim, divina, é algo que se construiu pela vontade do Senhor. É uma “reunião” que não é obra de homem algum, mas do próprio Deus.
-A igreja não é uma reunião a esmo, sem propósito nem tampouco lugar. A igreja é o conjunto dos “reunidos para fora”, ou seja, é um povo que está “fora”, que se encontra em um lugar distinto e diferente do dos demais povos.
-Ora, sabemos que a humanidade, por causa do pecado, encontra-se longe de Deus (Pv.15:29; Is.46:12; Mc.7:6), mas, quando aceita o chamado do Senhor, crendo em Jesus como seu único e suficiente Senhor e Salvador, pelo sangue de Cristo deixa de ficar longe e passa a estar perto do Senhor (Dt.30:14; Sl.145:18; At.2:39; Ef.2:13,14).
-Por isso, a igreja é formada por aqueles que estão “fora” do pecado, “fora” do mundo, “fora” das trevas. Há, portanto, uma verdadeira oposição entre a “igreja” e o “mundo”.
Muito feliz o item 8 do Cremos da Declaração de Fé das Assembleias de Deus ao afirmar que a Igreja é formada pelos que foram “…chamados do mundo pelo Espírito Santo para seguir a Cristo e adorar a Deus”.
-Não é por outra razão que a “igreja” é denominada pelos estudiosos como a “agência do reino de Deus na Terra”, precisamente porque é se distinguindo dos demais homens, saindo para “fora do mundo” que se passa a pertencer a ela, o que nos faz lembrar as palavras de Jesus a Nicodemos a respeito do novo nascimento, sem o qual não se pode ver nem entrar no reino de Deus (Jo.3:3,5).
A igreja é um povo que se encontra na face da Terra mas que pertence a um reino que não é deste mundo (Jo.18:36 “in initio”).
-Este primeiro significado de “igreja” é o que se chama, também, de “igreja universal”, entendida esta como a reunião de todos os homens que creram em Cristo em todos os tempos, a partir da obra redentora na cruz do Calvário, a “universal assembleia e igreja dos primogênitos, que estão inscritos nos céus” (Hb.12:23a), ao “corpo de Cristo” (I Co.12:27; Ef.4:12), a “a geração eleita, o sacerdócio real, a nação santa, o povo adquirido” (I Pe.2:9), o conjunto de todos os que creram em Jesus Cristo ao longo da história e que se reunirá, pela vez primeira, quando do arrebatamento da Igreja, os quais serão apresentados ao Pai pelo Filho com as seguintes palavras: “Eis-me aqui a mim e aos filhos que Deus me deu.”(Hb.2:13 “in fine”).
-É precisamente isto que diz o já mencionado item 8 do Cremos, que transcrevemos em mais uma parte: “…una, santa e universal assembleia dos fiéis remidos de todas as eras e todos os lugares…”.
-Mas, além deste significado primeiro da palavra “igreja”, também encontramos um outro significado nas Escrituras, notadamente a partir do livro de Atos dos Apóstolos, quando nos deparamos com a chamada “igreja local”, ou seja, a igreja que se encontra em um determinado lugar, significado este que surge, pela vez primeira, em At.8:1, quando se fala na perseguição que se iniciou contra “a igreja que estava em Jerusalém”, para, logo em seguida, dizer que os membros desta igreja foram dispersos, com exceção dos apóstolos, passando a pregar a Cristo em todos os lugares, começando a narrativa por Samaria, para onde fora Filipe. Neste significado, encontramos a palavra “igreja” no plural, como se lê, por exemplo, em At.9:31, que fala das “igrejas em toda Judeia, e Galileia, e Samaria”.
-A “igreja local” nada mais é que um conjunto de pessoas que dizem crer em Jesus Cristo e que professam a Sua doutrina e que se encontram numa determinada localidade.
É uma reunião de pessoas que, chamadas por Deus, passam a obedecer às Escrituras e aos ensinos do Senhor Jesus, e, por isso mesmo, pregam a Cristo e ensinam a Palavra de Deus a todos quantos vivem naquele determinado lugar. A “igreja local”, portanto, é um grupo social, uma reunião de pessoas, uma partícula da “igreja universal”, do “corpo de Cristo”.
– Como afirma a Declaração de Fé das Assembleias de Deus: “…Além de assembleia universal dos crentes em Jesus, o vocábulo ‘igreja’ refere-se a um grupo de crentes em cada localidade geográfica [At. 11:22; I Co.1:2; Gl.1:2]…” (DFAD XI, p.119).
-O crescimento da igreja, a evangelização, o cumprimento do “ide” de Jesus fez com que a igreja, o corpo de Cristo, passasse a ser maior do que a “igreja local”, que, era, então, restrita a Jerusalém (ainda que, em verdade, desde o dia de Pentecostes, que é o início da evangelização desta dispensação, já tenhamos pessoas que tenham aceitado a Cristo e não tenham ficado em Jerusalém, vez que estavam na cidade apenas para aquela festividade).
-Passou a haver muitas “igrejas”, cada uma em um local, em um lugar, mas todas unidas espiritualmente pela comunhão com o único e verdadeiro Deus, pelo Espírito Santo que os mantinha em unidade com o Pai e o Filho. Como diz At.9:31: “Assim, pois, as igrejas em toda a Judeia, e Galileia, e Samaria tinham paz e eram edificadas, e se multiplicavam, andando no temor do Senhor e na consolação do Espírito Santo”.
-Tem-se, portanto, na Igreja, que é o Corpo de Cristo, a reprodução da própria dupla natureza que encontramos em Cristo Jesus.
-Assim como Jesus é homem e Deus simultaneamente, sendo uma unidade e uma diversidade a um só tempo, também o Seu corpo, isto é, a Igreja, por Ele edificada, é, ao mesmo tempo, uma unidade, vez que se trata de o corpo de Cristo, o povo adquirido, a nação santa, mas também é uma pluralidade, pois são várias as igrejas, cada uma em um determinado lugar, em um determinado local. O único povo de Deus apresenta-Se sob muitas formas, demonstrando que o único Deus (Rm.16:27; I Tm.1:17; Jd.25) é, também, multiforme (Ef.3:10; Hb.1:1; I Pe.4:10).
-Deus, que criou o homem como um ser social (Gn.2:18), providenciou para que esta unidade espiritual desde já instaurada pelo perdão dos pecados e pela salvação em Cristo Jesus não se mantivesse apenas como uma nação espiritual, pois isto seria insuficiente para a obra da evangelização e do aperfeiçoamento dos santos, tratando de estabelecer que a vida espiritual sobre a face da Terra, até a chamada individual de cada um para a eternidade, ou o arrebatamento da Igreja, com o término desta dispensação, se desse por meio da criação de um grupo social, onde os homens pudessem uns aos outros ajudar na dura e espinhosa jornada da fé: a “igreja universal” depende, pois, da “igreja local” para chegar, em bom termo, à sua “inauguração”, o que se dará no dia do arrebatamento da Igreja.
II– A ORIGEM DA IGREJA
-Vistos estes dois conceitos de igreja, resta-nos ver o que a Bíblia tem a dizer sobre a origem da Igreja. Quando ela surgiu? Quando ela foi concebida?
-Pois bem, assim como a salvação estava prevista desde antes da fundação do mundo, de igual modo a igreja já estava estabelecida por Deus ainda antes que o mundo existisse.
A igreja foi o “…mistério de Cristo, o qual noutros séculos não foi manifestado aos filhos dos homens, como agora tem sido revelado pelo Espírito aos Seus santos apóstolos e profetas, a saber, que os gentios são coerdeiros e de um mesmo corpo, e participantes da promessa em Cristo pelo evangelho.” (Ef.3:4-6).
-Como afirma a Declaração de Fé das Assembleias de Deus: “…A igreja envolve um mistério que não foi revelado no Antigo Testamento, mas que foi manifesto aos santos na nova aliança [Ef.5:32; Cl.1:26,27]…” (DFAD XI, p.120).
-A igreja era o grande mistério de Cristo que só foi revelado pelo próprio Senhor quando fez a famosa “declaração de Cesareia”, quando afirmou que edificaria a Sua igreja e as portas do inferno não prevaleceriam contra ela (Mt.16:18).
-Parece-nos que havia como que uma senha do Pai ao Filho, para que Ele só revelasse este grande mistério quando o Pai revelasse a um homem que Jesus era o Cristo, o Filho do Deus vivo.
-Isto aconteceu em Cesareia de Filipe, que era uma cidade construída por Filipe, tetrarca da Itureia e da província de Traconites, filho de Herodes, o Grande (Lc.3:1), e que era um “abrigo idólatra” na terra de Israel, pois ali havia vários templos de diversas divindades, inclusive templos em homenagem aos dois primeiros imperadores romanos, César Augusto e Tibério.
-Neste local, onde havia culto a vários deuses, o Pai revela a Pedro que o único e verdadeiro Deus havia Se humanizado e era o Senhor Jesus e, então, diante de tal revelação, Cristo revela o mistério da Igreja, este povo que se formaria por intermédio do Deus feito homem.
-A igreja, portanto, é um projeto exclusivamente divino, concebido, executado e sustentado por Deus. É por isso que podemos ter a certeza, e a história tem demonstrado isto, que nada pode destruir a Igreja.
-Durante estes quase dois mil anos em que a igreja tem participado da história da humanidade, muitos homens poderosos se levantaram contra a Igreja, tentaram destruí-la e não foram poucas as vezes em que se proclamou que a Igreja estava vencida.
No entanto, todos estes homens passaram, mas a Igreja se manteve de pé, vencedora, demonstrando que não se trata de obra humana, mas de algo que é divino e contra o qual todos os poderes das trevas não têm podido prevalecer.
OBS: Diante de tantos exemplos históricos, relatemos dois episódios elucidativos desta realidade. O imperador romano Juliano (331-363, imperador de 361 a 363) perseguiu impiedosamente os cristãos, depois que os cristãos já haviam sido reconhecidos por Roma, tendo ele mesmo abandonado o Cristianismo.
Pouco antes de morrer, numa campanha militar em 363, é dito que exclamou em alta voz: “venceste, ó Galileu”.
Na China comunista, os cristãos foram impiedosamente perseguidos e toda obra missionária naquele país foi impedida totalmente.
Com a abertura do regime a partir de 1979, pensou-se que o Cristianismo estaria dizimado naquele país e, para surpresa de todos, o número de cristãos no período difícil do governo de Mão-Tsé-Tung (1947-1979), dobrou naquele país. Ninguém pode prevalecer contra a igreja do Senhor Jesus!
-Concebida ainda antes da fundação do mundo, como primeiro momento da congregação de tudo em Cristo Jesus (Ef.1:10), a Igreja foi revelada por Jesus na famosa “declaração de Cesareia”.
No entanto, somente teria existência própria a partir do instante em que Jesus subiu aos céus, assentando-Se à direita de Deus, visto que a igreja é “o corpo de Cristo”.
-Enquanto Jesus não ascendeu aos céus, não poderia haver uma verdadeira “igreja”, visto que Jesus ainda estava com os discípulos.
A partir do instante, porém, em que ascendeu aos céus, passamos a ter a Igreja, Igreja que iniciaria a Sua missão evangelizadora a partir da descida do Espírito Santo, no dia de Pentecostes, ato inicial da dispensação da graça e de apresentação da Igreja ao mundo.
-Assim, podemos dizer que a Igreja começa efetivamente no dia de Pentecostes, visto que a Igreja nada mais é que “…a geração eleita, o sacerdócio real, a nação santa, o povo adquirido, para que anuncieis as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz” (I Pe.2:9) e isto só se deu a partir do dia de Pentecostes.
OBS: O fato de o início da atividade da Igreja ter se dado no dia de Pentecostes, não quer dizer que ela tenha sido inaugurada neste dia, como bem atesta o pastor Osmar José da Silva, cujo pensamento ora transcrevemos:
““…A Igreja de Jesus Cristo é composta de bilhões vezes bilhões de almas, uma multidão que homem algum jamais poderá calcular.
Com certeza, a Igreja será inaugurada quando todos os remidos, de todos os tempos, juntamente com os santos que morreram desde o princípio da geração, e foram evangelizados por Cristo após a ressurreição, estiverem reunidos em número incalculável, liderados pelo Senhor Jesus Cristo, que irá adiante da grande multidão e nos apresentará ao Pai, dizendo: Hebreus 2.12:’
…Eis-Me aqui, e aos filhos que Deus Me deu.’ Então haverá festa nos céus, todas as hostes celestiais se alegrarão juntamente com todos os seus servos.…” (SILVA, Osmar José da. Reflexões filosóficas de eternidade a eternidade, v.6, p.110).
-Há estudiosos que entendem que, no dia de Pentecostes, a Igreja nasceu, ou seja, veio à luz, mas que ela teria sido gerada no dia da crucifixão de Jesus, no Calvário, quando o Senhor foi traspassado por uma lança no lado, quando, então, jorrou sangue e água (Jo.19:34).
-Assim como Eva foi retirada do lado de Adão, entendem tais estudiosos que a Igreja é retirada do corpo de Cristo, pois, com este traspasse, tanto foram derramadas as últimas gotas do sangue de Jesus, o sangue que faz com que seja possível o surgimento deste novo povo de Deus (Ef.2:13,14), como se derramou água, sabendo que só quem é nascido da água e do Espírito pode entrar no reino de Deus (Jo.3:5).
OBS: Este escrito de um padre católico romano bem sintetiza este entendimento: “…O peito traspassado é o novo templo: dele jorra o Espírito e a vida, num movimento de subida e descida: a água e o sangue que escorrem do lado do Senhor geram a vida, e a vida retorna ao lado direito do Senhor.
O templo deixa de ser um lugar para ser a morada eterna em espírito e em verdade (cf. Jo 4,25b). Do lado do primeiro Adão nasceu Eva, a mãe da vida que trouxe em si o germe da morte. Do lado aberto de Cristo, o novo Adão, nasce a Igreja, a nova Eva, mãe que gera filhos chamados à vida eterna.…” (BESEN, José Artulino. O lado aberto, manancial de água viva. Disponível em: https://pebesen.wordpress.com/2012/07/04/v-o- lado-aberto-manancial-de-agua-viva/ Acesso em 02 nov. 2023).
-Agostinho (354-430) foi um dos que deu esta interpretação, “in verbis”: “…Por esta razão foi feita a primeira mulher do lado de Adão adormecido e o segundo Adão, inclinando a cabeça, dormiu na cruz para que fosse formada a Sua esposa e saísse de seu lado durante Seu sono.
Ó morte, que aos mortos ressuscita! O que é mais puro que este sangue? O que é mais saudável que esta ferida? …( Sobre João. In: AQUINO, Tomás de. Cátena áurea 13921. Citações de Jo.19:31-37. Jo.19:31. Disponível em: https://www.clerus.org/bibliaclerusonline/pt/index.htm Acesso em 02 nov. 2023) (tradução nossa de texto em espanhol).
-Esta geração se completa com a ressurreição de Cristo, quando, então, os discípulos recebem o Espírito Santo, na tarde do domingo da ressurreição (Jo.20:22), recebendo, pois, o selo que é decorrência da fé em Jesus, da entrada na graça (Jo.7:38,39; Ef.1:13; Rm.5:1,2).
-Assim como na formação do homem (Gn.2:7), a Igreja primeiro exsurge como um corpo inerte, no dia da crucifixão e recebe o sopro de vida na tarde do domingo da ressurreição.
-No dia de Pentecostes, então, ocorre o derramamento do Espírito Santo, o revestimento de poder, vindo à luz este novo povo que se revela, assim, em meio a todas as nações, como a Igreja de Cristo, a Igreja de Deus.
-O primeiro a se surpreender com a revelação da Igreja foi o diabo que, sem perder tempo, já procurou usar o mesmo Pedro, a quem o Pai havia revelado a identidade de Jesus, para tentar dissuadir o Senhor a realizar a obra salvífica para a qual havia sido enviado pelo Pai.
-Instantes depois que Jesus revela o mistério da Igreja e reafirma a Sua obra salvífica (esta já de conhecimento de Satanás pois fora objeto de profecias ao longo dos séculos), Pedro é usado pelo diabo para tentar despertar em Jesus uma autocompaixão (Mt.16:22).
-Cristo Jesus, entretanto, repreende Satanás, dizendo que ele não entende as coisas de Deus, mas somente as dos homens (Mt.16:23).
-Isto nos mostra, portanto, como a Igreja é de origem divina e não pode ser entendida racionalmente nem reduzida a parâmetros puramente humanos, como muitos intentaram fazer ao longo de toda a história desta dispensação.
-A Igreja é de Jesus, é Seu corpo, e, portanto, é dirigida por Cristo, cujos caminhos não são os nossos caminhos, nem os pensamentos, os nossos pensamentos (Is.55:8,9).
-Por isso, todos quantos quiseram reduzir a Igreja a uma instituição social, a uma empresa, a um império político, naufragaram em seus intentos e, por vezes, foram instrumentos diabólicos neste embate sempre presente entre a Igreja e Satanás, entre a Igreja e as portas do inferno.
-A Igreja apresenta-se, ao longo da história, como instituição social, como empresa, como império político, mas jamais se reduziu a estes aspectos e, por vezes, teve de enfrentar tais aspectos que se tornaram “anti- Igreja”, mas sempre seguiu triunfante, amparada e dirigida pelo seu Mestre e Senhor, guiada pelo Espírito Santo, o verdadeiro Vigário de Cristo, ou seja, o “outro Consolador” que veio ficar ao lado da Igreja enquanto Jesus não volta para buscá-la (Jo.14:16-18,26; 16:7).
Pr. Caramuru Afonso Francisco
Fonte: https://www.portalebd.org.br/classes/adultos/10139-licao-1-a-origem-da-igreja-i