INTRODUÇÃO
-Na sequência do estudo da Apologética Cristã, estudaremos o que é ser cristão.
-Os cristãos estão firmados na sã doutrina.
I – A RELIGIOSIDADE DO SER HUMANO
-O ser humano é um ser religioso por natureza. Religião é a atividade segundo a qual o homem procura se religar à Divindade.
Conforme constatado pelos cientistas sociais, em todo agrupamento humano foi encontrada a atividade religiosa, a ponto, inclusive, de o “pai da sociologia”, o judeu francês Émile Durkheim (1858-1917), ter considerado ser a religião a própria atividade que dá estrutura e vida à sociedade.
-Quando verificamos a narrativa bíblica da criação, imediatamente observamos que o homem foi feito para ser o elo de ligação entre Deus e a criação terrena.
-O homem é o único ser que, a um só tempo, é espiritual e material (Gn.2:7), pois, formado do pó da terra, tem um corpo, corpo este que é, como comprovam os cientistas, composto de todos os elementos químicos naturais existentes, sendo, portanto, a síntese de toda a matéria existente no Universo, o que o põe ao lado da criação terrena, ou seja, dos animais, vegetais e minerais.
-Mas o homem também recebeu fôlego divino da vida e foi feito alma vivente (Gn.2:7), de modo que tem também um componente imaterial, a alma e o espírito (I Ts.5:23), o que faz com que o homem se assemelhe, neste aspecto, a Deus, que é espírito (Jo.4:24), bem como aos anjos, que são, igualmente, seres espirituais (Hb.1:14).
-Esta constituição espiritual-material torna o homem o elo de ligação entre Deus e a criação, e isto se explica precisamente pelo fato de que Deus tornou o homem o Seu administrador sobre a criação terrena, tendo a missão de dominar os demais seres existentes sobre a face da Terra (Gn.1:28; Sl.8:4-8).
-É fundamental que o administrador tenha comunicação e comunhão com o dono. Administrar é dirigir, é servir a alguém e, deste modo, quem administra precisa sempre prestar contas a quem está a servir, a quem está a cumprir tarefas.
-Vemos esta realidade na parábola do mordomo infiel (Lc.16:1-13), onde Jesus nos mostra que o administrador foi chamado a prestar contas depois que foi acusado de que estava a dissipar os bens de seu
senhor e, portanto, tem o mordomo de se comunicar, ter um diálogo com o senhor, como também estar em comunhão com ele, ou seja, em unidade de propósitos.
-Pois bem, foi exatamente isto que fez Deus em relação ao homem. Iniciou com ele um constante diálogo e lhe deu ordem para que houvesse comunhão, e, pela ordem dada (Gn.2:16,17), chamou de vida esta manutenção de comunicação e comunhão.
-Quando, entretanto, o homem pecou, desobedecendo à ordem dada, esta comunicação e comunhão foram quebradas, pois o pecado gera a separação entre Deus e o homem (Is.59:2), que é a morte espiritual. Quebrou-se, pois, a ligação entre o homem e seu Criador.
-Esta quebra gerou, no interior do ser humano, um “vazio do tamanho de Deus”, porquanto o Senhor, ao criar o homem, pôs a eternidade em seu coração (Ec.3:11 NAA), e somente Deus é Eterno, de modo que nada pode substituir esta ausência divina na existência humana, pois tudo que existe debaixo do sol é “vaidade de vaidades”, como bem disse o sábio Salomão que, tendo se distanciado do Senhor, buscou encontrar sentido na vida terrena em si mesma (Ec.1:2).
-É esta busca de sentido na vida, esta tentativa de se religar a Deus que gera a religião e que é algo que se encontra em todo ser humano, pois é um dado atinente à própria natureza e estrutura do ser humano, feito para existir linkado ao Senhor.
-No entanto, o homem, no pecado, tem sua mente cegada pelo deus deste século (II Co.4:4) e, por causa disto, ainda que tenha o testemunho tanto da natureza quanto da sua própria consciência a respeito da existência e senhorio de Deus (Rm.1:18-20), recusa a glorificar a Deus e cria discursos que se desvanecem e, deste modo, geram “religiões” que não conseguem restabelecer esta comunicação e comunhão com o Senhor (Rm.1:21- 23).
-Os caminhos e pensamentos de Deus são muitissimamente superiores aos dos homens (Is.55:8,9) e, portanto, não pode o homem, por si só, a partir de si mesmo, construir um caminho que o leve de volta à comunicação e comunhão com Deus.
-Por isso mesmo, são milhares e milhares as religiões existentes, pois os homens não têm como chegar, com suas próprias forças, à presença de Deus, não podem retirar o pecado que gerou esta separação entre o Senhor e os homens e o pecado gera não só a morte mas a destituição da glória de Deus (Rm.3:23).
-Se, ao mesmo tempo em que as inúmeras religiões existentes comprovam a necessidade que o homem tem de Deus e o anseio de toda alma humana para se satisfazer em Deus (Sl.42:2), esta multiplicidade também revela que todas as religiões são ilusórias, fruto da rebeldia e cegueira espiritual humanas, que nunca levarão à comunhão almejada, à vida eterna.
-São todas elas fruto do obscurecimento do coração humano insensato, uma loucura, algo totalmente inapropriado para o ser que foi feito racional e, por causa disto, a religião acaba levando, paradoxalmente, às concupiscências do coração, à imundícia, à desonra do corpo, porquanto a manutenção do homem nesta presunção de querer ele próprio dizer qual o caminho que leva à religação com Deus faz com que o próprio Senhor permita a entrega a estas coisas tão abomináveis, já que mudam a verdade de Deus em mentira (Rm.1:24).
-É bom frisar que, desta triste situação, não escaparam sequer os israelitas. Embora Israel tenha sido um povo formado por Deus para ser Sua propriedade peculiar dentre os povos (Ex.19:5,6), recebendo a lei do Senhor e, portanto, não tendo uma religião que tenha partido do homem, mas, sim, de Deus.
-O fato é que os israelitas cedo descumpriram a lei, no episódio do bezerro de ouro, deixando de ser o povo sacerdotal (Ex.32), mas, graças à intercessão de Moisés, não deixaram de ser o povo de Deus (Ex.34), sendo
ensinados por Moisés a que aguardassem o profeta como ele, o Messias, a quem deveriam ouvir (Dt.18:15- 19).
-Alguns séculos depois, o povo pediu um rei, não querendo mais que Deus reinasse sobre eles (I Sm.8:5-7), até porque, há muito, já estavam a desconsiderar Deus como rei (Jz.21:25), deixando assim de ser o reino de Deus, ainda que o Senhor tenha dito que o Messias viria da casa real de Davi (II Sm.7:16; I Rs.8:25).
-Entretanto, os israelitas rejeitaram o Messias (Jo.1:12; 19:14,15), preferindo se apegar às suas tradições, que invalidavam, por vezes., os mandamentos divinos (Mt.15:3-9) e que deram origem ao judaísmo, que é mais uma religião que tem origem no homem e não em Deus, tanto que, ao lado das Escrituras (e incompletas, pois rejeitam, logicamente, o Novo Testamento), construíram o Talmude, que nada mais é que a tradição reduzida a escrito (a “Mishná”) comentada pelos doutores da lei (“Guemará”).
II – A RELIGIÃO PURA E VERDADEIRA
-Apesar de todas as estas falsas religiões, falsas por terem origem no homem, que não pode, por si só, chegar- se a Deus, o fato é que a religiosidade humana é a demonstração cabal de que o homem precisa do Senhor, que é imperioso que haja esta religação, suplantando-se o estado de separação gerado pela prática do pecado.
-Esta necessidade já fora anunciada pelo próprio Deus no dia mesmo da queda da humanidade. Deus prometeu restabelecer a amizade entre Deus e o homem por intermédio da “semente da mulher” (Gn.3:15).
-Para tristeza e desespero do diabo, a quem foi dada esta notícia, Deus não iria manter o homem no estado de perdição eternamente, mas, bem ao contrário, providenciaria o nascimento de um ser humano que pagaria o preço do pecado e, assim, reconciliaria a humanidade com Deus.
-Para tanto, Deus Se faria homem, vindo como o “último Adão” (I Co.15:45), nascendo de mulher, a fim de tornar o homem novamente amigo de Deus, perdoando os seus pecados, cujo preço seria o derramamento de sangue deste Deus feito homem.
-Nota-se, portanto, que se opera a religação entre Deus e o homem, mas, não a partir do homem, e, sim, a partir de Deus e, como Deus é único (Dt.6:4), esta religião que parte de Deus é também única.
-Mas do que isto, esta religião que parte de Deus é verdadeira, pois Deus é a verdade (Jr.10:10), assim como o Deus que Se fez homem, Jesus, também é a verdade (Jo.14:6).
-Esta religião, tendo origem em Deus, precisa ser levada ao conhecimento do homem, pois, conforme vimos, o homem não pode alcançar a dimensão divina, mas Deus pode vir ao encontro do ser humano.
-Foi o que fez o Senhor para anunciar esta notícia de restabelecimento da ligação entre Deus e o homem, e, bem por isso, esta religião está baseada no Evangelho, ou seja, na “boa notícia”, na “boa nova” de que é possível a salvação.
-Por isso, o anúncio da verdadeira religião é chamado de Evangelho, que foi, por primeiro, anunciada pelo próprio Deus, tanto a Adão (Gn.3:15 – o chamado “protoevangelho”), quanto a Abraão (Gl.3:8).
-Formado Israel, o Senhor Se revelou a este povo, que aceitou ser Sua propriedade peculiar dentre os povos, por intermédio da lei e dos profetas (Hb.1:1), revelação que mandou reduzir a escrito e que forma o Antigo Testamento, também chamadas de Escrituras hebraicas.
-Esta revelação é a demonstração de que a religião tem origem em Deus, devendo, pois, o homem ouvir e atender ao que é falado por Deus e era isto que o Senhor exigia não só dos israelitas (Mq.6:8), mas também
de todos os povos, a quem os israelitas deveriam informar a respeito do único e verdadeiro Deus (Dt.31:12; I Rs.8:41-43; II Cr.6:32,33).
-Esta disposição divina para o conhecimento de Sua revelação a todos os povos se demonstra quando as Escrituras hebraicas são traduzidas para o grego, então a língua internacional, a chamada Septuaginta, que faz com que haja conhecimento por parte de outras nações a respeito da revelação divina a Israel.
-Por fim, com o nascimento de Jesus, o Messias prometido (Gl.4:4), e o cumprimento da promessa da salvação da humanidade, com a Sua morte e ressurreição, ressurreição que é a garantia da veracidade desta religião, o Evangelho passou a ser pregado a judeus e gentios (At.2:30-38; 3:13-26; 10:34-43; 13:16-41; I Co.15:17).
-Completa-se, então, a revelação, com o próprio Deus feito homem Se revelando aos homens (Hb.1:1), o que é reduzido a escrito em o Novo Testamento, ficando, assim, igualmente completadas as Escrituras, que testificam de Jesus (Jo.5:39).
-A religião verdadeira é, portanto, acessível a todas as gerações, ante a redução a escrito (Dn.12:4; Hc.2:2,3; Ap.1:19; 22:18,19), e este escrito, que é a Palavra de Deus, é, por conseguinte, a verdade (Jo.17:17).
-Daí a obrigação da Igreja de pregar o Evangelho por todo o mundo a toda criatura (Mc.16:15), devendo ser testemunha de Cristo até os confins da Terra (At.1:8).
-Esta religião, além de verdadeira, é pura, pois se trata da revelação de Deus ao homem, da religação a partir de Deus, Deus que é santo, como proclamam os serafins diante de Seu trono incessantemente nos céus (Is.6:1-3).
-Deus é puro (Hc.1:13; I Jo.3:3) e, portanto, a religião que nele tem origem é necessariamente pura.
-Esta pureza, como tudo que provém de Deus, é total, de modo que a religião é imaculada, ou seja, não tem qualquer mancha, não tem qualquer senão, não tem qualquer defeito.
Por isso mesmo, os animais que eram oferecidos ao Senhor no culto levítico deveriam ser sem mancha (Lv.1:3,10; 3:1,6; 4:3,23,28,32; 5:15,18; 6:6; 9:2,3) ou sem defeito (Lv.22:20,21; Nm.19:2; Dt.15:21; 17:1).
-Esta ausência de mancha ou defeito não só tipifica o Senhor Jesus, o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo (Jo.1:29), como também que a religação feita entre Deus e o homem, a restauração da comunhão é ela própria pura e imaculada.
-A religião verdadeira e pura é, pois, também imaculada e a ela se refere Tiago, o irmão do Senhor, ao dizer que a religião pura e imaculada para com Deus, o Pai é esta: visitar os órfãos e as viúvas nas tribulações e guardar-se da corrupção do mundo (Tg.1:27).
-A religião pura e verdadeira realmente religa o homem a Deus, pois é uma religião que tem a iniciativa divina, parte de Deus e, por isso mesmo, transforma o homem, retira o seu pecado e, como resultado disto, faz com que o homem ame a Deus, mantendo a santificação obtida pelo perdão de seus pecados (“guardar-se da corrupção do mundo”) como também ama o próximo, promovendo-lhe o bem-estar (“visita os órfãos e as viúvas nas tribulações”).
-Esta religião pura e verdadeira é o Cristianismo, ou seja, a doutrina trazida e ensinada por Jesus Cristo, pelo Messias que é o Salvador da humanidade.
É o Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus (Mc.1:1), aquilo que Jesus começou não só a fazer mas a ensinar (At.1:1), o Evangelho da graça de Deus (At.20:24), o evangelho da nossa salvação (Ef.1:13), a sã doutrina (I Tm.1:10; II Tm.4:3; Tt. 1:9; 2:1).
III – A DOUTRINA CRISTÃ
-A religião pura e imaculada, a religião verdadeira foi logo identificada no mundo, pois era algo diferente de tudo quanto havia surgido até então.
-Os judeus, os primeiros a conviverem com esta nova religião, denominaram os primeiros discípulos de Jesus de “seita dos nazarenos”, porque Jesus era conhecido como Jesus, o Nazareno, pois, como fora criado em Nazaré, era considerado como natural daquela cidade da Galileia (Mt.2:23; 26:71; Mc.1:24; 14:67; 16:6; Lc.4:34; 18:37; 24:19; Jo.18:5,,7; 19:19; At.2:22; 3:6; 4:10; 6:14; 22:8; 26:9).
-Esta alcunha dada pelos judeus já mostra como a fé dos discípulos estava na pessoa de Jesus, como diziam ser Jesus o Cristo, o Deus feito homem, o Salvador da humanidade, a nos indicar, portanto, qual é a nota característica desta religião, ou seja, reconhecer que a religação entre Deus e o homem se faz unicamente por meio de Jesus Cristo (At.4:12; I Tm.2:5).
-Outra forma pela qual os discípulos de Jesus eram conhecidos era como “o Caminho” (At.19:9,23; 22:4; 24:14,22), expressão também muito elucidativa, pois faz menção de que Jesus é o Caminho (Jo.14:6), ou seja, a via para se chegar a Deus, o meio pelo qual se alcança a vida eterna, a comunhão com o Senhor, ou seja, uma vez mais faz sobressair a pessoa de Jesus nas crenças de Seus seguidores.
-O apóstolo Paulo, mesmo, diz que os judeus se referiam ao “Caminho” como uma seita (At.24:14), ou seja, os judeus reconheciam que a crença dos discípulos de Jesus discrepava do entendimento dos religiosos judeus a respeito das Escrituras, exatamente por causa do reconhecimento de Jesus como o Cristo.
-A proeminência da pessoa de Jesus fica ainda mais evidenciada quando Lucas nos dá conta de que o presidente da Judeia, Festo, considerava a doutrina seguida por Paulo como uma “superstição” em que o apóstolo dizia que “um tal Jesus, defunto” estaria a viver segundo o apóstolo (At.25:19), a revelar que o centro da pregação era a morte e ressurreição de Jesus, “Cristo e Este crucificado”, como diria o apóstolo, mais tarde, aos coríntios (I Co.2:2).
-Mas, entre os gentios, os discípulos passariam a ser conhecidos como “cristãos”. Esta alcunha surgiu já quando do surgimento da primeira igreja gentílica, a igreja em Antioquia, onde, pela primeira vez, os discípulos foram chamados de “cristãos” (At.11:26).
-A palavra “cristão” significa “parecido com Cristo”, “semelhante a Cristo”, “pequeno Cristo”. Foram os antioquitas quem assim passaram a chamar os discípulos, a revelar, pois, que o nome “cristão” não foi uma autodenominação da membresia da igreja, mas um nome dado pelos que não serviam ao Senhor.
-Isto já nos mostra uma verdade espiritual, qual seja, a de que a prática da religião verdadeira remete as pessoas a Jesus, o que não ocorre com as demais religiões, que, via de regra, remetem as pessoas aos praticantes da religião, promovem os religiosos mais do que a própria religião.
-A religião verdadeira é a que promove a religação entre Deus e os homens e, portanto, a sua prática faz com que as pessoas sejam levadas a Deus, identifiquem a Pessoa Divina, cumprindo-se assim o próprio objetivo da atividade religiosa.
-Não é por outro motivo que o Senhor Jesus, no sermão do monte, que é o sermão didático aos Seus discípulos, dizem que os homens devem ver as boas obras dos cristãos para que glorifiquem ao Pai que está nos céus (Mt.5:16), pois o verdadeiro e genuíno discípulo de Cristo tão somente reflete como espelho a glória do Senhor (II Co.3:18).
-O texto bíblico que nos faz menção do início da utilização do nome de “cristão” fala-nos que os habitantes de Antioquia, que nunca tinham visto ou ouvido Jesus, pois Jesus nunca ali esteve, passaram a chamar os seguidores do Senhor de “cristãos”, porque os acharam “parecidos com Cristo”, “semelhantes a Cristo”, “pequenos Cristos”.
-Como eles nunca viram ou ouviram Jesus, temos que esta constatação se deveu a uma comparação entre o modo de vida dos discípulos e o modo de vida de Jesus, Jesus que só era conhecido pela pregação feita por Barnabé (At.11:22), Paulo (At.11;25), os crentes judeus que haviam iniciado a evangelização daquela cidade (At.11:20) e os que se convertiam (At.11:21).
-Os que haviam se convertido foram devidamente ensinados por Barnabé e Paulo (At.11:26), durante um ano, até porque, por serem gentios, eram pessoas que conhecimento algum tinham das Escrituras.
O ensino, portanto, era o ensino das Escrituras, o ensino da verdade e isto produziu, entre eles, uma transformação, uma conversão, uma mudança de vida.
-Esta mudança foi notada pelos antioquitas, que viam uma total modificação de vida naqueles que se convertiam, dos seus concidadãos, já que não podiam notar isto na vida daqueles que haviam se mudado para Antioquia, que lhes eram desconhecidos.
-Ao notarem estas mudanças, os antioquitas começaram a perceber que eles passaram a viver, a imitar aquele Jesus que eles mesmos pregavam como sendo Senhor e Cristo, como sendo o Salvador da humanidade, O que fazia a religação com o único e verdadeiro Deus.
-Passaram, então, os antioquitas a chamar estes discípulos que não só pregavam mas viviam de acordo com esta “nova doutrina”, “esta pregação de deuses estranhos” (Cf. At.17:18) de “cristãos”, visto que estavam a viver como o Cristo por eles anunciado.
-Ser “cristão”, portanto, é, em primeiro lugar, crer que Jesus é o Senhor e Cristo, o Deus feito homem que veio ao mundo para salvar a humanidade. É crer na confissão feita por Pedro e que lhe foi revelada pelo Pai em Cesareia de Filipe: Quem é Jesus? O Cristo, o Filho do Deus vivo (Mt.16:15-17).
-Não é coincidência de que esta declaração feita por Pedro se tenha dado em Cesareia de Filipe, exatamente a localidade na Galileia onde se concentravam templos e altares a diversas divindades gentílicas, algo que era uma raridade na terra de Israel, apesar de já não haver exclusividade de população judaica.
-Ser “cristão” é crer na divindade de Jesus Cristo, que Ele é o Filho de Deus vivo e tal crença é a nota característica da religião verdadeira.
-Toda heresia combate esta verdade bíblica, oriunda da própria revelação divina direta a Pedro. Um dos sinais característicos da heresia é a distorção quanto a pessoa de Jesus.
-Ser “cristão” é viver como Cristo. Os discípulos de Antioquia tinham um “modus vivendi” que correspondia ao Jesus que era pregado, ou seja, olhando para um discípulo, Cristo era visto, pois o discípulo procurava imitar a Jesus no seu dia-a-dia.
-Jesus disse que Seus discípulos eram a luz do mundo e, como tal, deveriam resplandecer. Ora, o próprio Senhor Jesus Se identificou como sendo a luz do mundo (Jo.8:12; 9:5) e, portanto, textualmente disse que nós devemos ser como Ele, tê-l’O como exemplo, seguindo as Suas pisadas (I Pe.2:21), andando como Ele andou (I Jo.2:6).
-Bem se nota que ser cristão não é algo apenas teórico, mas também prático, ou seja, não se trata de ter o conhecimento de um sem-número de verdades reveladas pelo Senhor, mas de ter uma nova maneira de viver, abandonando-se o modo de vida recebido por tradição de nossos pais, uma ruptura com o pecado e a vida construída debaixo desta natureza pecaminosa (I Pe.1:18,19).
-Ser “cristão” envolve este rompimento com o pecado, o que somente é possível porque crer em Jesus é “nascer de novo” (Jo.3:3), ser novamente gerado pela Palavra de Deus, a semente incorruptível (I Pe.1:23).
-Bem por isso o apóstolo Paulo, naquele que muitos consideram ser o primeiro livro a ser escrito do Novo Testamento, ao sintetizar a vida espiritual cristã, referindo-se aos tessalonicenses, diz que esta vida tem três pilares, sendo o primeiro, precisamente, a conversão.
-Paulo afirma que, ao pregar o Evangelho para os tessalonicenses, eles se converteram dois ídolos a Deus (I Ts.1:9).
-O resultado da pregação do apóstolo foi a de que houve conversão, ou seja, mudança de direção, alteração de comportamento, modificação de conduta.
Antes, aquelas pessoas eram idólatras, consideravam os ídolos como seus deuses, os “deuses costumeiros”, ensinados pelos seus pais, adorados ao longo dos anos em sua cidade.
-A idolatria é resultado da falsa religiosidade, como já visto supra, consequência da recusa de glorificação a Deus apesar de Sua revelação seja por meio da natureza, seja por meio da consciência, fruto da rebeldia da humanidade contra o Senhor, ocorrida no episódio da torre de Babel (Gn.10:8,9; 11:1-4).
-Em certa medida, todas as religiões existentes no mundo e que têm seu ponto de partida no homem são idólatras, pois substituem o único e verdadeiro Deus por ídolos, falsos deuses, mudando a verdade de Deus em mentira e honrando e servindo mais a criatura do que o Criador (Rm.1:25).
-Ídolo é tudo aquilo que toma o lugar de Deus e a origem de toda idolatria, diz-nos o apóstolo, está na recusa a glorificação a Deus e no desprezo da verdade divina por raciocínios, pensamentos e imaginações humanas, que nada mais é que a crença na mentira satânica de que podemos ser iguais a Deus (Gn.3:5).
-Assim, o que se tem é que o primeiro ídolo é o próprio homem, homem que, dizendo-se sábio, torna-se louco (Rm.1:22), a ponto de passar a adorar imagens e até animais irracionais, chamando-os de deuses.
-Neste ponto, aliás, de relembrar dois pensadores que, de modo parcial, trataram desta questão. O primeiro é o filósofo grego Xenófanes de Colofão (570-475 a.C.), crítico da religião politeísta grega, que teria dito o seguinte:
“Mas se mãos tivessem os bois, os cavalos e os leões. E pudessem com as mãos desenhar e criar obras como os homens, Os cavalos semelhantes aos cavalos, os bois semelhantes aos bois, Desenhariam as formas dos deuses e os corpos fariam, Tais quais eles próprios têm.”
-O filósofo percebeu que os deuses eram fruto da imaginação humana e, por isso, eram tão parecidos com os homens, sendo, pois, sua projeção, de modo que a religião nada mais era que o resultado da mente humana e, como tal, incapaz de fazer a religação com o único Deus, pois Xenófanes dizia que “Um é o Deus”.
-Evidentemente que tal pensamento do filósofo se aplica às religiões falsas e é respaldado pelo texto bíblico há pouco mencionado, porquanto a divinização de imagens e criaturas é resultado desta recusa de glorificação a Deus, desta “independência do eu” pregada ao primeiro casal por Satanás.
-O segundo pensador é o filósofo alemão Ludwig Feuerbach (1804-1872), cujos escritos muito influenciariam Karl Marx, que considerava que a religião era uma “antropologia”, ou seja, um discurso humano, fruto da imaginação que cria um deus a partir de conceitos ideais humanos.
-Embora o objetivo de Feuerbach fosse negar toda e qualquer religião, que ele considerava como uma “patologia psíquica”, o fato é que sua análise faz sentido com relação às falsas religiões, pois, novamente, encontramos respaldo bíblico para seu pensamento, pois, evidentemente, toda religião falsa é uma criação humana, uma transformação em objeto daquilo que é pensado por alguém que, recusando-se a glorificar a Deus, tenta, mesmo assim, fazer a religação com a Divindade.
-A religião verdadeira é a única que nos converte dos ídolos a Deus, pois, diante do novo nascimento, faz- nos voltar a Jesus e a conseguir o perdão dos nossos pecados e, assim, retirados das trevas espirituais, convertemo-nos à luz e do poder de Satanás a Deus, a fim de que recebamos a remissão dos pecados e sorte entre os santificados pela fé em Jesus (At.26:19).
-Não se pode ser cristão quando nos mantemos na idolatria, a começar da “idolatria do eu”, pois o ego é o maior de todos os ídolos.
Por isso mesmo, Jesus disse que quem quiser vir após Ele, deve negar-se a si mesmo. Quem não renuncia a si mesmo não pode ser discípulo de Jesus, não pode ser cristão (Lc.14:33).
-Prosseguindo a síntese de Paulo quanto à vida espiritual do cristão, diz ele que os tessalonicenses haviam também decidido “servir o Deus vivo e verdadeiro” (I Ts.1:9).
-A conversão realizada tem um objetivo, uma finalidade: “para servir o Deus vivo e verdadeiro”.
-Ser “cristão” é se submeter ao senhorio do “Deus vivo e verdadeiro”. Só serve quem é servo e só é servo aquele que tem um senhor e este senhor outro não é senão “o Deus vivo e verdadeiro”.
-O discípulo de Jesus tem a vida eterna porque faz a vontade de Deus (I Jo.2:17). A vida eterna é conhecer ao Pai como único Deus verdadeiro e a Jesus Cristo, a quem o Pai enviou (Jo.17:3).
-Quando conhecemos ao Pai (e tal conhecimento somente se dá por meio de Jesus Cristo, do que Ele nos disse – Jo.15:15), reconhecemos que é Ele o Deus vivo e verdadeiro e, portanto, digno de toda adoração e a quem devemos servir (Dt.6:13; Mt.4:10),por ser o Senhor de todas as coisas (Sl.24:1).
-Quando conhecemos a Jesus e o reconhecemos como o Enviado do Pai, o Salvador, também passamos a servir a Deus, porque assim como o Pai enviou a Jesus, Jesus nos enviou a pregar o Evangelho (Jo.20:21).
-Bem por isso o Senhor Jesus disse que quem quisesse vir após Ele deveria “tomar a sua cruz”, que nada mais é realizar a tarefa, a obra que Lhe havia sido dada a fazer (Jo.17:4).
-Ser “cristão”, portanto, é, a exemplo de Jesus, cumprir a tarefa que se der ao discípulo durante a sua peregrinação terrena.
-Por fim, o apóstolo Paulo diz que os tessalonicenses convertidos e servidores também estavam a esperar Jesus, o Filho de Deus, que ressuscitou dos mortos, que os livrará da ira futura (I Ts.1:10).
-Esta expressão do apóstolo dá-nos importantes ensinos sobre o que é ser cristão. Por primeiro, é alguém que tem uma dimensão eterna da vida, que está esperando Jesus, que não tem esta terra como objetivo de sua existência, mas que está a buscar a pátria celestial, a exemplo do que fizeram os patriarcas, segundo o escritor aos hebreus (Hb.11:14-16).
-Por segundo, ser “cristão” é alguém que considera Jesus como Filho de Deus, ou seja, reconhece a divindade de Cristo, como já dito supra.
-Por terceiro, ser “cristão” é crer na ressurreição de Jesus Cristo, crer que Jesus está vivo e voltará para arrebatar a Sua Igreja e, tendo esta esperança, vive o cristão uma vida de santidade, como nos diz o apóstolo João (I Jo.3:3).
-O “cristão”, diz Paulo, será livre da ira futura, que é a Grande Tribulação, um tempo de angústia como nunca houve na história humana (Dn.12:1).
-Isto, entretanto, não significa que o “cristão” não passará por aflições neste mundo. Na outra passagem bíblica em que se tem a palavra “cristão”, o apóstolo Pedro diz que o cristão padecerá enquanto tal (I Pe.4:16), sofrendo ardente prova, sendo participante das aflições de Cristo (I Pe.4:12,13).
-O “cristão” sabe que, neste mundo, sofrerá aflições (Jo.16:33) e que, como disse Jesus, deve segui-l’O (Mc.8:34; Lc.9:23).
-Quem segue a Jesus, passa por onde Ele passou, ou seja, tem de, por primeiro, passar pela paixão, pelo sofrimento, para, posteriormente, chegar ao trono celestial (Hb.12:2).
-Por isso, em todas as cartas que mandou João escrever às igrejas da Ásia Menor, Jesus Cristo faz promessas àqueles que vencerem, numa clara afirmação de que ser “cristão” é lutar ao longo desta vida, luta que o apóstolo Paulo diz ser contra as hostes espirituais da maldade nos lugares celestiais (Ef.6:12) e que o apóstolo João diz ser contra o mundo que está no maligno (I Jo.5:4,19), mundo que nos odeia, como nos ensinou o próprio Cristo (Jo.15:18,19).
-Ser “cristão”, portanto, é ser um oponente do mundo, um oponente do maligno e, portanto, evidentemente, não pode o “cristão” ser inserido na tão propalada “fraternidade universal” que está sendo construída no segmento religioso da humanidade, base da religião anticristã que levará à adoração do Anticristo e, por conseguinte, do diabo, sob os auspícios do Falso Profeta (Ap.13:4,8).
-Não é, portanto, novidade alguma que, em meio a esta pregação de absoluta tolerância religiosa, esteja a aumentar a perseguição a todos quantos professem o nome de Jesus como seu único Senhor e Salvador, mais uma clarividente demonstração que estamos a viver o “princípio das dores” (Mt.24:9).
-Ser “cristão” é “nadar contra a correnteza”, “remar contra a maré” (Ef.2:1-3), opondo-se a tudo quanto se tem defendido e propagado nestes dias tão difíceis em que vivemos.
-Será que somos cristãos? Pensemos nisto!
Pr. Caramuru Afonso Francisco
Fonte: https://www.portalebd.org.br/classes/adultos/11144-licao-2-somos-cristaos-i