INTRODUÇÃO
-Na sequência do estudo da vida cristã como “o Caminho”, refletiremos sobre a confissão e o abandono dos pecados.
-Não há como ir para o céu se não confessarmos os pecados e deixarmos sua prática.
I – A CHAMADA DIVINA À SALVAÇÃO
-Na sequência do estudo da vista cristã como “o Caminho”, refletiremos sobre a necessidade de confissão dos pecados e o abandono da sua prática para podermos chegar aos céus.
-O apóstolo João é claro ao dizer que os que vivem na prática do pecado são filhos do diabo (I Jo.3:8-10), de modo que não há como ser filho de Deus em tal condição.
-A salvação do homem na pessoa de Cristo Jesus foi planejada por Deus mesmo antes da fundação do mundo (Ef.1:4; I Pe.1;20; Ap.13:8). No Seu planejamento, o Senhor já decidiu que a salvação somente se daria por meio de Jesus Cristo, o Deus que Se fez homem para pagar o preço dos pecados.
-Vemos, portanto, que a salvação tem origem em Deus. A salvação foi projetada na mente divina e, por isso mesmo, é eterna (Is.45:17; Hb.5:9).
Em sendo assim, não há coisa alguma no universo que possa impedir a salvação de se realizar, de modo que não é necessário a Deus, em Sua soberania, de impedir que algum ser humano possa optar entre a salvação, ou não, pois a salvação somente se dará para aqueles que cumprirem os requisitos previamente estabelecidos por Deus para a salvação, ou seja, a fé em Cristo Jesus, após Jesus ter morrido pelo pecador, entregando Sua vida por ele.
-Tendo origem em Deus, a salvação precisa ser adquirida pelos seres humanos, pois quem deve ser salvo é o homem. Deus oferece a salvação a todos os homens (I Tm.2:4), mas não são todos os que se salvam, precisamente porque a vontade divina de salvação não se confunde com a vontade humana, vontade esta criada por Deus e que, por isso mesmo, é por Ele respeitada.
-Tendo origem em Deus, a salvação se inicia, evidentemente, com esta deliberação divina de salvar o homem, deliberação que se tornou conhecida da humanidade no dia mesmo da queda, quando o Senhor a revela em Seu diálogo com a antiga serpente, o diabo e Satanás, como que a mostrar que a tentação e queda do homem não tinham alterado em coisa alguma o amor de Deus para com o homem e a própria soberania divina.
-Se Deus não tivesse querido salvar o homem, jamais o homem poderia ter a oportunidade da salvação. Movido pelo Seu amor, o Senhor decidiu que o homem teria esta chance e, por isso, planejou a salvação humana.
É neste sentido, portanto, que devemos entender as expressões bíblicas da “eleição” (I Ts.1:4; I Pe.1:2; II Pe.1:10) e da “predestinação” (Rm.8:29,30; Ef.1:5,11) divinas, que tanta celeuma tem gerado ao longo dos séculos entre os estudiosos da Bíblia.
-“Eleição” é o ato de eleger, o ato de escolher, ou seja, trata-se de uma manifestação de vontade. “Predestinação” é o ato de predestinar, ou seja, fixar previamente o destino de alguém. A Bíblia mostra-nos que a salvação é fruto de uma manifestação da vontade soberana de Deus.
O Senhor escolheu salvar o homem, mesmo sabendo que ele haveria de pecar, e previamente determinou que todos aqueles que crerem em Cristo serão salvos e os que não o crerem, serão condenados.
A salvação é para todos os homens (Is.55:1; Tt.2:11), sem qualquer distinção, tanto que o primeiro casal foi expulso do Éden e impedido de tomar da árvore da vida para que toda a humanidade tivesse a mesma oportunidade de salvação, até porque Deus é imparcial e não faz acepção de pessoas (Dt.10:17; At.10:34), mas, já antes mesmo da fundação do mundo, o Senhor estipulou condições para que tal salvação se desse, mas nem por isso deixou de querer que todos os homens se salvem (I Tm.2:4).
-Como afirma a Declaração de Fé da CGADB: “…O Soberano Deus não predestinou incondicionalmente pessoa alguma à condenação eterna, mas, sim, almeja que todos, arrependendo-se, convertam-se de seus maus caminhos: ‘Mas Deus não tendo em conta os tempos da ignorância, anuncia agora a todos os homens, em todo lugar, que se arrependam’ (At.17:30).
A predestinação genuinamente bíblica diz respeito apenas à salvação, sendo condicionada à fé em Cristo Jesus, estando relacionada à presciência de Deus (Ef.1:4,5; I Pe.1:2). Portanto, a predestinação dos salvos é precedida pelo conhecimento prévio de Deus daqueles que, diante do chamamento do Evangelho, recebem a Cristo como o seu Salvador pessoal e perseveram até o fim (Mt.10:22; Ap.3:5)…” (X,1, p.110).
-Para tanto é necessário observar que, depois de ter deliberado salvar o homem, o Senhor anunciou esta deliberação, ou seja, ocorreu a vocação, o chamamento à salvação. A comunicação desta vontade divina, que é o que se denomina de “vocação” ou “chamamento” (I Co.1:26; Gl.1:6; Ef.1:18; Fp.3:14; II Tm.1:9).
Deus revelou a Sua vontade ao homem de salvá-lo, esta boa-nova, esta boa notícia, este “evangelho”, desde o instante mesmo da queda, como se lê em Gn.3:15, que, por isso mesmo, é conhecido como o “protoevangelho”, ou seja, a primeira boa-nova.
Para executar a obra da salvação, o Senhor chama o homem, traz-lhe o conhecimento da Sua vontade de salvá-lo. Por isso, Jesus veio anunciar o evangelho (Mc.1:14,15) e incumbiu a Sua Igreja, que é o Seu corpo (I Co.12:217; Ef.4:12), de ter como prioritária a pregação do Evangelho (Mc.16:15).
-Assim como a eleição de Deus é para todos os homens, embora já os tenha predestinado, aos que aceitarem Sua salvação à vida eterna e aos que não a aceitarem ao desprezo eterno (Dn.12:2), assim também é o chamamento. A chamada é para todos os homens, por isso se deve pregar o evangelho a toda a criatura (Mc.16:15).
A chamada é para todas as nações, por isso só virá o fim desta dispensação, instaurada pela consumação da salvação (Jo.1:17; Hb.10:19-23), depois que este evangelho for pregado a todas as nações (Mt.24:14).
Não é, aliás, por outro motivo que a Bíblia afirma que “muitos são os chamados” (Mt.22:14), porquanto a palavra do texto original grego é “polloi” (πολλοί) cujo significado é “quase todos”, a “esmagadora maioria”. O objetivo de Deus é, portanto, chamar a todos os homens para a salvação. Este chamamento é universal.
-Deus chama o homem a salvação e o fez, pela vez primeira, pessoalmente, quando tornou conhecida a Sua vontade ao primeiro casal, que presenciou o Seu diálogo com a serpente.
Em seguida, demonstrou ao homem a realidade deste chamado à salvação na medida em que não permitiu ao homem o acesso à árvore da vida, impedindo que a situação de pecado ficasse irreversível (Gn.3:22), como também providenciou ao homem, mediante o sacrifício de um animal, que tivesse ele vestimentas condizentes para que, então, pudesse lavrar a Terra e, de forma penosa, obtivesse, mediante o trabalho, a sua sobrevivência (Gn.2:21), sobrevivência que
era querida por Deus precisamente para dar ao homem a oportunidade para crer e se arrepender dos seus pecados.
-Em seguida, o Senhor passou a trabalhar na consciência do homem, chamando-o à salvação por intermédio desta “voz interior”, que representa o que é mantido ativo no espírito do homem, mesmo estando ele separado de Deus em virtude do pecado. Foi, assim, por exemplo, que chamou Caim ao arrependimento (Gn.4:6-15).
-Esta chamada divina para o homem se arrepender é efetuada mediante a “graça preveniente, preventiva ou salvadora”, que é definida pelo Livro de Disciplina da Metodista Unida como “… o amor divino que cerca toda humanidade e precede cada um de, e todos, os nossos impulsos conscientes.
Essa graça proporciona o nosso primeiro desejo de agradar a Deus, o nosso primeiro vislumbre de entendimento sobre a vontade de Deus, e a nossa ‘primeira breve convicção’ de ter pecado contra Deus.
A graça de Deus também desperta em nós um ardente desejo de libertação do pecado e morte, assim como nos leva ao arrependimento e a fé.…” (apud Graça preveniente. In: WIKIPÉDIA. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Gra%C3%A7a_preveniente Acesso em 18 ago. 2017) ou, ainda, pelo Manual da Igreja do Nazareno como sendo a capacitação de “…todos os que queiram converter-se do pecado para a retidão, a crer em Jesus Cristo para perdão e purificação do pecado, e a praticar boas obras agradáveis e aceitáveis à Sua vista.… (apud Graça preveniente. In: WIKIPÉDIA, end.cit.).
-Tem-se, portanto, que o homem, embora esteja “mortos em seus delitos e pecados” (Ef.2:1), é, pela graça divina preveniente, capaz de desejar salvar-se, de poder crer que Jesus é o Salvador e que pode perdoar os seus pecados. A morte espiritual do homem deve ser entendida como uma separação de Deus e não como uma aniquilação da vontade humana.
Como ensina Norman Geisler: “…morte “espiritual” na Bíblia é uma expressão forte, significando que seres caídos estão totalmente separados de Deus, mas não completamente anulados por Ele. Como disse Isaías: ‘As suas maldades separam vocês do seu Deus’ (Is 59.2).
Em resumo, a morte não significa a destruição total da capacidade de ouvir e de responder a Deus, mas uma separação completa de Deus.…” (Eleitos, mas livres: uma perspectiva equilibrada entre a eleição divina e o livre-arbítrio. Trad. Heber Campos. São Paulo: Vida, 2005, p.64).
-Pela graça preveniente, portanto, o homem é capaz de ouvir o chamado de Deus para a salvação e de escolher entre atender, ou não, a este chamado. Este chamado, como dissemos, dá-se primeiro pela consciência.
-Mas o Senhor, no Seu desejo de salvar o homem, não Se limitou a chamar o homem pela consciência, como também levantou profetas para que eles levassem a mensagem divina.
Tomou o Senhor esta providência no instante mesmo em que os que invocavam o nome do Senhor (os descendentes de Sete, chamados de “filhos de Deus” em Gn.6:2) passaram a se misturar e a adotar o “modus vivendi” dos demais seres humanos (chamados de “filhos dos homens” em Gn.6:2), o que parece ter se dado quando do nascimento de Jarede, pai de Enoque (pois o nome “Jarede” significa “descida”, a indicar o início da degeneração da linhagem de Sete).
-Enoque, então, é levantado para anunciar que o juízo divino viria sobre os ímpios, ou seja, aqueles que não atendessem ao chamado divino para a salvação (Jd.14,15) e, desta forma, surge a figura do “profeta”, ou seja, do “mensageiro de Deus”, que, deste modo, acrescenta mais um modo pelo qual o homem faria conhecido o chamado divino à salvação.
-Por isso mesmo, o escritor aos hebreus foi enfático ao dizer que Deus falou, muitas vezes, e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas (Hb.1:1), profetas estas que foram levantados pelo Senhor até João Batista (Lc.16:16).
-Este chamado divino à salvação é reafirmado pelo próprio Deus por intermédio do Evangelho, que é a mensagem trazida por Jesus Cristo, o Deus que Se fez homem, mensagem esta própria dos últimos dias, entendidos estes como os dias que se seguem à consumação da obra salvífica com a morte de Jesus na cruz do Calvário, quando, então, é efetivamente cumprida a promessa da salvação.
-Jesus passa a ser, Ele próprio, o mensageiro da salvação, o que faz, após Sua ascensão aos céus, através do Seu corpo por Ele mesmo edificado sobre a face da Terra, que é a Igreja. O Evangelho, portanto, a ser pregado pela Igreja por todo o mundo e a toda criatura (Mc.16:15) é o meio pelo qual se faz conhecido o chamado divino à salvação.
-Cabe à Igreja, portanto, anunciar este chamado divino à salvação, chamado este que se adiciona ao chamado pela consciência e que substituiu o chamado por meio dos profetas que, como diz o Senhor Jesus, durou até João Batista. Deus quer salvar e o anuncia seja pela pregação do Evangelho, seja pela consciência humana, consciência que, às vezes, é despertada pela graça divina mesmo antes do anúncio do Evangelho.
-É por isso que devemos compreender como autênticas certas intervenções divinas que se têm tido conhecimento em nossos dias, notadamente no mundo muçulmano, de pessoas que são impulsionadas por sonhos ou visões a procurar saber algo sobre Jesus, ou seja, provocam alguém a lhes pregar o Evangelho, até diante da impossibilidade que se teve de haver tal pregação sem tal “provocação”.
OBS: “…De acordo com uma reportagem da Christian Broadcasting Network (CBN), o programa de TV “Reflections” do evangelista Hazem Farraj, do Oriente Médio, está alcançando altos níveis de audiência entre os muçulmanos. Farraj disse à CBN que recebe testemunhos de muçulmanos sobre visões e sonhos com Jesus.
Tom Doyle, evangelista, pastor e diretor do ministério e3 para o Oriente Médio e a Ásia Central confirma: ‘Os muçulmanos estão chegando ao Cristianismo por meio de visões e sonhos’. ‘Grandes coisas estão acontecendo no mundo islâmico’, afirma Doyle em um e-mail enviado ao WND. “É tudo muito inesperado”.
O pastor ressalta que conhece o programa de Farraj e que Jesus está avançando onde os missionários não conseguiram. ‘Temos visto isso por cerca de 15 anos, onde muçulmanos não são mais muçulmanos, mas seguidores de Jesus’, relata Doyle. ‘São cristãos, dispostos a morrer por Cristo’. ‘E tudo começou com um sonho’, conta. ‘Eles tiveram sonhos com Jesus, e alguns tiveram muitos deles.
Depois de um tempo eles procuravam cristãos, pois os sonhos se tornavam tão intensos que eles queriam uma resposta’. Doyle explica que a conversão de um muçulmano ao Cristianismo ainda envolve um processo muito difícil, mesmo para os que tiveram sonhos. ‘Ninguém vai para cama muçulmano e acorda cristão’, ressalta. ‘Existem algumas barreiras entre eles e Jesus.
Disseram a eles que os cristãos adoram três deuses. Disseram a eles que a Bíblia é corrompida. É o que dizem a eles, algo como uma retórica partidária’. Mas os sonhos, segundo Doyle, são um ponto de partida. ‘Eles são motivados a procurar a Bíblia, procurar um cristão e perguntar o que significa.
Noventa e cinco por cento dos muçulmanos que agora seguem Jesus dizem que foram levados ao Cristianismo por alguém que lhes explicou o sonho’, sustenta.
Ele conta que escreveu um livro chamado ‘Dreams and Visions’ (“Sonhos e Visões”), em que registra histórias reais de muçulmanos que agora seguem Cristo, e que o fizeram depois de terem tido sonhos com Jesus. E acrescenta que o fenômeno está acontecendo na Arábia Saudita, no Irã, no Egito, na Síria e na Cisjordânia.…” (SEVERO, Júlio. Muçulmanos tendo visões de Jesus? 26 ago. 2013. Disponível em: http://juliosevero.blogspot.com.br/2013/08/muculmanos-tendo-visoes-de-jesus.html Acesso em 18 ago. 2017).
-O chamado divino à salvação, nestes últimos dias, portanto, dá-se pela pregação do Evangelho, pelo anúncio da Palavra, Palavra esta que nada mais é que a fiel testemunha de Cristo Jesus (Jo.5:39), o Verbo de Deus (Jo.1:1; Ap.19:13).
-É esta Palavra que transporta a “fé salvadora” ou “fé salvífica”, meio pelo qual vem a salvação para o homem (Ef.2:8). O apóstolo Paulo é enfático ao dizer que “a fé vem pelo ouvir e o ouvir pela Palavra de Deus” (Rm.10:17).
-A Palavra vem até nós pela pregação, proporcionando a salvação da humanidade, está junto de nós, na nossa boca e em o nosso coração (Rm.10:8), como, aliás, revelou o próprio Senhor, pela boca de Moisés, ao povo de Israel, que foi, então, convidado a escolher entre o bem e o mal (Dt.30:11-15), palavra que seria proferida em toda a sua extensão e intensão pelo “profeta como Moisés” (Dt.18:15-19), que veio falar não só a Israel mas a todas as nações (Is.42:1-7; 49:1-6).
-É o que o Senhor nos ensinou na parábola do semeador (Mt.13:1-23; Mc.4:1-20; Lc.8:4-15), onde a semente, que é a Palavra de Deus (Mt.13:19; Mc.4:14; Lc.8:11), é lançada pelo semeador, que é o pregador do Evangelho, ou seja, um membro em particular do corpo de Cristo, um membro da Igreja (I Co.12:27), .
-Esta Palavra, pregada a todos, encontrará diferentes reações nos corações dos ouvintes, que são representadas pelos diferentes terrenos da parábola: a beira do caminho (indiferença à Palavra), os pedregais (atendimento à Palavra sem a permanência na Palavra), os espinhais (atendimento à Palavra que cede às coisas deste mundo) e a boa terra (o atendimento e perseverança à Palavra).
-Esta é a “palavra da fé que pregamos” (Rm.10:8). Como ensina o comentarista bíblico Matthew Henry: “…o evangelho e a promessa que ele traz, chamado de palavra da fé porque ele é o objeto da fé com a qual está
ligada a palavra na qual cremos; porque ele é o preceito da fé, ordenando-a e fazendo dela a grande condição da justificação; e porque é o meio habitual pelo qual a fé é operada e transmitida. Ora, o que é essa palavra da fé? Nós temos o teor dela nos versículos 9 e 10 [Rm10:8,9 – observação nossa], o resumo do evangelho, o qual é suficientemente claro e fácil.
Observe: Em primeiro lugar, o que nos é prometido: ‘…serás salvo’. E salvação o que o evangelho apresenta e oferece – salvação da culpa e da ira, com a salvação da alma, uma salvação eterna, cujo autor é Cristo, um Salvador completo.…” (Comentário Bíblico do Novo Testamento: Atos a Apocalipse. Trad.Luiz Aron, Valdemar Kroker e Haroldo Janzen, pp.371-2).
-A Palavra traz a fé, por isso é a “palavra da fé” e, ao trazer a fé, o Senhor cria as condições para que o homem creia e obtenha a salvação, já que o meio escolhido pelo Senhor para que se desse a salvação é a fé em Cristo Jesus, a “semente da mulher” que pôs a inimizade entre o homem e a serpente (Gn.3:15), Aquele que desfez as obras do diabo (I Jo.3:8).
-A salvação dá-se “por meio da fé” (Ef.2:8). Esta fé está ao alcance de todos os homens porque é trazida pelo anúncio da salvação, anúncio que se faz mediante a pregação do Evangelho, pregação esta que é feita por todo o mundo a toda criatura (Mc.16:15), incumbindo-se o Senhor de efetuá-la mesmo quando a Igreja não pode tomar a iniciativa de fazê-lo, como estão a demonstrar os já mencionados testemunhos de “sonhos e visões” no mundo islâmico.
-A fé em Jesus Cristo é a condição estabelecida soberanamente pelo Senhor para a salvação, pois, como ensina o filósofo Régis Jolivet (1891-1966):
“… A condição é o que permite à causa, produzir seu efeito, seja positivamente a título de instrumento ou de meio (assim, o arco é para o violinista a condição da melodia que vai tocar), — seja negativamente, afastando os obstáculos (assim, o pianista deve fazer afinar seu piano, se quer tocar direito)…” (As causas. In: Curso de filosofia. Disponível em: http://www.consciencia.org/cursofilosofiajolivet25.shtml Acesso em 18 ago. 2017). A fé em Jesus permite que a obra salvífica de Cristo produza o efeito de salvar cada ser humano que crê, como diz o escritor aos hebreus: “Ainda que era Filho, aprendeu a obediência, por aquilo que padeceu. E, sendo Ele consumado, veio a ser a causa de eterna salvação para todos os que Lhe obedecem” (Hb.5:9).
-Como diz Dave Hunt: “…A Bíblia diz repetidamente que somos ‘salvos, mediante a fé’ (Ef.2:8). Paulo disse ao carcereiro de Filipos: ‘Crê no Senhor Jesus Cristo e serás salvo[…]’ (At. 16:31). Em grego, ‘crer’ é sempre um verbo ativo — algo que se faz, e não algo feito a ele (…). Os muitos versos já citados, no entanto, alguns dos lábios do próprio Cristo, claramente fazem o crer uma condição do novo nascimento e da salvação, que só pode resultar da fé.
A razão bíblica de que todos os homens não são salvos, apesar de Cristo ter morrido por todos, é que nem todos creem no evangelho, que é o ‘poder de Deus para salvação de todo aquele que crê’ (Rm.1:16).
‘Todo aquele que quiser’, usado repetidamente nas Escrituras, implica que, apesar de que todos possam, muitos não querem.…” (Que amor é este? : a falsa representação de Deus no calvinismo. Trad. de Cloves Rocha dos Santos e Walson Sales da Silva. São Paulo: Reflexão, 2015, p.442).
II – A FÉ SALVADORA OU SALVÍFICA
-Mas, o que vem a ser “fé”? “Fé” é uma das menores palavras da Bíblia Sagrada em língua portuguesa, mas seu tamanho é inversamente proporcional a seu profundo significado, ou melhor, significados, porque esta tão diminuta palavra encerra diversos significados no texto bíblico, sendo que nossa lição se deterá apenas em um deles, a saber, a fé enquanto uma das qualidades do fruto do Espírito.
-A palavra “fé” no Antigo Testamento (em hebraico “‘emun” – אמו) aparece, explicitamente, apenas duas vezes, em Dt.32:20 (que, em português, nas Versões Almeida(corrigida, fiel, revista e contemporânea), é traduzido por ‘lealdade’ e na Século 21 “não se pode confiar”) e em Hc.2:4, o conhecido texto em que se diz que o justo viverá pela fé e que será, posteriormente, utilizado por Paulo na epístola aos Romanos como base de toda a sua dissertação a respeito da justificação.
Na Versão Almeida Revista e Corrigida, a palavra só aparece, além de Hc.2:4, em I Sm.21:5, mas como parte da expressão “boa fé”, que, como já vimos na lição anterior, designa ingenuidade, inocência, benevolência. Como afirma o Novo Dicionário da Bíblia, porém,
“…isso não significa, entretanto, que a fé não seja elemento importante no ensino do Antigo Testamento, pois ainda que a palavra não seja frequente, a ideia o é. É usualmente expressa por verbos tais como ‘crer’, ‘confiar’ ou ‘esperar’, os quais ocorrem com abundância.(…) o exame cuidadoso revelará que, no Antigo Testamento, tal como no Novo, a exigência básica é a atitude correta para com Deus, isto é, a fé.…” (MORRIS, L.L. MORRIS. Fé. In: DOUGLAS, J.D. (org). O Novo Dicionário da Bíblia, p.605-6).
-Em o Novo Testamento, a palavra grega é “pistis” (πίστις) que, juntamente com o verbo e adjetivos correspondentes (“pisteuo” – πιστεύω e “pistos” – πιστός respectivamente), aparece dezenas de vezes (L.L. Morris, em o Novo Dicionário da Bíblia, fala que substantivo e verbo aparecem mais de 240 vezes e o adjetivo, 67 vezes).
“…Essa ênfase sobre a fé deve ser vista em contraste com a obra salvadora de Deus, em Cristo Jesus. No Novo Testamento, o pensamento que Deus enviou Seu Filho para ser Salvador do mundo é central.(…). A fé é atitude mediante a qual o homem abandona toda confiança em seus próprios esforços para obter a salvação (…) É a atitude de plena confiança em Cristo, de dependência exclusiva d’Ele.…” (MORRIS,
L.L. Fé. In: DOUGLAS, J.D. (org). O Novo Dicionário da Bíblia, p.606).
-Como já podemos perceber, a palavra “fé” traduz conceitos fundamentais, essenciais na revelação de Deus ao homem através da Sua Palavra e não é de admirar, portanto, que a palavra tenha servido para expressar diferentes conceitos, diferentes ideias. Deter-nos-emos, aqui, porém, no significado de “fé” objeto de nosso estudo, a chamada “fé salvadora” ou “fé salvífica”.
-Lewis Sperry Chafer diz que a “fé salvadora” é “…a confiança entretecida nas promessas e nas provisões de Deus a respeito do Salvador que faz o eleito repousar e confiar no Único que pode salvar…” (Teologia sistemática, t.4, v.7, p.131), ou seja, é a crença de que Jesus é o único e suficiente Senhor e Salvador de nossas vidas.
Quando alguém dá crédito à pregação do Evangelho, considera-se um pecador e se arrepende dos pecados e crê que Jesus pode perdoá-los e se submete à vontade de Deus, crendo que Jesus pode dar-lhe a vida eterna e levá-lo ao céu, age com a “fé salvadora” ou “fé salvífica”.
-Esta fé não nasce no homem, mas é dom de Deus (Ef.2:8). Através da Palavra de Deus (Rm.10:17), o Espírito Santo convence o homem do pecado, da justiça e do juízo (Jo.16:8-11) e, deste modo, o homem crê e, mediante esta fé, é justificado (Rm.5:1), ou seja, posto numa posição de justo diante de Deus, o que lhe permite ter paz, isto é, comunhão com Deus, sendo vivificado em Cristo. Esta fé é a que concede salvação para o homem.
-A fé salvadora é um dom de Deus (Ef.2:8). É a capacidade que Deus dá ao homem para crer que Jesus Cristo é o Senhor e Salvador e, portanto, que devemos nos arrepender de nossos pecados e passar a servir- Lhe, passando a fazer a Sua vontade.
Quando o homem pecou, perdeu a condição de poder retornar a uma vida de comunhão com Deus. O pecado fez separação entre Deus e o homem não tinha como salvar-se. Por isso, o próprio Deus deu-lhe a boa notícia (o evangelho), ainda no jardim do Éden, de que alguém, da semente da mulher, iria esmagar a cabeça da serpente e triunfar sobre o mal, proporcionando um meio de o homem recuperar a comunhão perdida com Deus.
Para que o homem possa salvar-se, além de Jesus ter vindo ao mundo e morrido em nosso lugar, é preciso que sejamos convencidos de que somos pecadores e nos arrependamos e este convencimento exige a crença na obra salvadora de Jesus. Esta crença, esta fé, que nos traz a salvação, vem pelo ouvir e o ouvir pela Palavra de Deus (Rm.10:17). Esta fé não é de todos (II Ts.3:2), ao contrário da fé natural.
-A fé salvadora vem uma vez ao homem e realiza a obra da salvação. É pontual, ou seja, ocorre quando alguém crê em Jesus como seu único e suficiente Senhor e Salvador. É o dom divino que propicia a reconciliação entre Deus e o homem. É quem promove a justificação do homem e estabelece a comunhão, a paz entre ele e Deus.
-Assim, quando a Palavra é pregada, pela graça preveniente de Deus é permitido ao homem que tenha condições de dar atenção ao que é pregado. Este “ouvir pela Palavra de Deus” permite que o homem abra o seu coração e deixe a Palavra penetrar até a divisão da alma e do espírito (Hb.4:12).
OBS: Oportuno aqui transcrever um dos cânones do Concílio de Trento que, apesar de ter sido um concílio da Igreja Romana que condenou os ensinamentos da Reforma Protestante, neste ponto decidiu biblicamente: “797.
Declara ainda [o Santo Concílio]: o início da justificação dos adultos deve brotar da graça proveniente de Deus por Jesus Cristo, a saber, de Sua vocação, pela qual são chamados, sem qualquer merecimento da parte deles.
Assim, aqueles que estavam afastados de Deus pelos pecados, se dispõem [amparados] pela sua graça, que excita e auxilia (per eius excitantem atque adiuvantem gratiam), a alcançarem a conversão e a própria justificação, consentindo livremente nesta graça e livremente cooperando com ela; de forma que, tocando Deus o coração do homem com a iluminação do Espírito Santo, fica o homem por um lado não totalmente inativo, recebendo aquela inspiração, que poderia também rejeitá-la; por outro lado, não pode ele de sua livre vontade, sem a graça de Deus, elevar-se à justificação diante de Deus. Por isso, quando nas Sagradas Escrituras se diz: Convertei-vos a Mim e Eu Me converterei a vós (Zac 1,3), somos lembrados de nossa liberdade; quando, porém, respondemos: Convertei-nos, Senhor a vós, e seremos convertidos(Lam. 5, 21), confessamos que a graça de Deus nos previne.”
-Chegando ao espírito do homem, a fé salvífica, trazida pela Palavra, une-se à consciência e à “fé inata”, que existe já no espírito humano, pois, como sabemos, o espírito humano é dotado de suas faculdades: a consciência e a fé, entendida esta “fé natural” como “…uma qualidade do espírito humano que expressa a religiosidade do homem e o torna capaz de adorar, reverenciar, louvar e orar a Deus, o Criador.
Não se trata de um tipo de fé, adquirida ou ensinada, mas é uma forma inata que nasce com qualquer ser humano. Ela nos estimula a buscar a Deus e comungar com Ele.…” (As faculdades distintas do homem. Disponível em: https://aligadapalavra.wordpress.com/2012/08/03/as-faculdades-distintas-do-homem/ Acesso em 19 ago. 2017), ou, nas palavras do pastor João Maria Hermel, presidente das Assembleias de Deus em Passo Fundo/RS, “…o que leva o homem a buscar o seu Criador…” ( A doutrina do homem(Antropologia). In: Apostila da 63ª EBO da Igreja Evangélica Assembleia de Deus – Ministério do Belém. São Paulo: s.ed., 2009, p.102).
-A fé salvífica “ativa” o espírito, que está morto, visto que separado de Deus e sem qualquer função (pois sua única função é religar o homem a Deus) e se o homem “crê”, “acredita”, inicia um diálogo com Deus, na pessoa do Espírito Santo, e isto é que significa “abrir o coração”. Neste diálogo, inicia-se o convencimento do Espírito Santo, a persuasão que levará ao arrependimento.
-Foi o que aconteceu com Lídia em Filipos (At.16:14), um texto que costuma ser usado pelos seguidores da doutrina da predestinação incondicional, para dizer que Lídia somente deu ouvido à pregação de Paulo porque “o Senhor lhe abriu o coração”, querendo, com isto, afirmar que a abertura se deu por exclusiva obra divina, sem participação da vontade daquela mulher.
Sem dúvida, foi o Senhor quem abriu o coração, porque mandou a fé salvífica a Lídia que, então, como diz o texto, passou a prestar atenção ao que Paulo dizia e a fé salvífica foi levada até o espírito de Lídia, que passou a crer, num capacitação que lhe foi dada pela graça de Deus, mas que não se deu sem a participação voluntária dela.
-É possível, por isso mesmo, que, neste momento, o homem, em vez de “abrir o seu coração”, endureça-o, não queira iniciar um diálogo com o Espírito Santo, rejeitando, assim, a salvação.
A “graça preveniente” é resistível. Por isso, é aconselhado ao homem que não endureça o seu coração (Sl.95:8; Hb.3:5,18; 4:7), como fez Faraó (Ex.7:14,22; 8:15,19; 9:7) e, diante de tal endurecimento, não há diálogo entre Deus e o homem, de sorte que não se terá a salvação. A graça é resistível (At.7:51).
OBS: Por oportuno, reproduzimos aqui o Artigo 4 da Remonstrância[um dos cinco artigos proclamados pelos seguidores de Jacó Armínio em 1610 – observação nossa]: “Que esta graça de Deus é o começo, a continuação e o fim de todo o bem; de modo que nem mesmo o homem regenerado pode pensar, querer ou praticar qualquer bem, nem resistir a qualquer tentação para o mal sem a graça precedente (ou preveniente) que desperta, assiste e coopera. De modo que todas as obras boas e todos os movimentos para o bem, que podem ser concebidos em pensamento, devem ser atribuídos à graça de Deus em Cristo.
Mas, quanto ao modo de operação, a graça não é irresistível, porque está escrito de muitos que eles resistiram ao Espírito Santo”.
-É oportuno observar que Faraó tanto endureceu o seu coração que, por fim, o próprio Deus endureceu o coração do rei do Egito (Ex.9:12), algo que somente ocorreu depois que Faraó teve várias oportunidades para dar ouvidos ao Senhor.
Destarte, não é verdade o que dizem os seguidores da doutrina da predestinação incondicional de que Faraó já estava predestinado à perdição, tanto que Deus endureceu o seu coração. Devemos observar, ademais, que as palavras divinas em Ex.4:21 apenas avisaram a Moisés o que ia acontecer, dentro da presciência divina, mas isto não impediu que Deus desse reais oportunidades para Faraó dar ouvidos ao Senhor antes de ocorrer o que é dito em Ex.9:12, como provam os textos de Ex.7:14,22; 8:15,19; 9:7.
III – O CONVENCIMENTO DO ESPÍRITO SANTO E O ARREPENDIMENTO DOS PECADOS
-Se o homem passa a “dar ouvido” à pregação, recebe a fé salvífica, esta capacitação para que creia. A fé, chegando até o espírito humano, dá condições para que o homem comece a buscar a Deus, a querer dialogar com Ele. O Espírito Santo, então, passa a agir a fim de convencer o homem do pecado, da justiça e do juízo (Jo.16:8-11).
-A palavra grega utilizada em Jo.16:8 é “elencho” (έλέγχω), cujo significado é “mostrar o erro”, “admoestar”. O Espírito Santo começa a mostrar ao homem que ele está errado, precisa de salvação, é um transgressor da lei de Deus e necessita mudar de vida.
O Espírito Santo, através da Palavra pregada, mostra a verdade nua e crua para o homem que lhe está dando ouvidos, mostrando que ele precisa mudar de vida, que é preciso sair da difícil situação em que se encontra.
-Como nos ensina o Senhor Jesus, o Espírito Santo, primeiro, convence o homem do pecado, ou seja, mostra- lhe que ele é um pecador, que está em desobediência a Deus e que, portanto, está condenado à perdição eterna. Quem “abre o coração”, aceita esta argumentação do Espírito Santo, considera-se um pecador e admite a sua condição deplorável e miserável.
-O Espírito Santo mostra ao homem que ele não crê em Jesus e, portanto, não crê em Deus e esta sua incredulidade o está levando à perdição. O convencimento do pecado somente vem quando apresentamos Jesus ao pecador, porque é necessário crer n’Ele para se livrar do pecado, para crucificar a natureza pecaminosa.
É o olhar com fé a Jesus da mesma maneira que os israelitas no deserto olhavam para a serpente de metal para serem curados do veneno mortífero das serpentes ardentes (Nm.21:7-9; Jo.3:14,15).
Por isso, muito feliz a poetisa sacra Hedwig Elisabeth Nordlund quando exclamou: “Livres de pecado vós quereis ficar? Olhai p’ra o Cordeiro de Deus! Ele morto foi na cruz p’ra vos salvar; olhai p’ra o Cordeiro de Deus! Olhai p’ra o Cordeiro de Deus, olhai p’ra o Cordeiro de Deus, porque só Ele vos pode salvar, olhai p’ra o Cordeiro de Deus!” (primeira estrofe e refrão do hino 20 da Harpa Cristã).
-O Espírito Santo também convence da justiça, pois de nada adiantaria convencer apenas do pecado, mostrar que o homem é um pecador, pois aí se teria apenas uma acusação, algo que o inimigo de nossas almas também faz.
Após mostrar que o homem é pecador, o Espírito Santo convence o homem de que Jesus é justo e justificador daquele que tem fé em Jesus (Rm.3:26). Não só o homem se percebe um pecador como é apresentado ao Salvador e se crer que Ele é o Salvador alcançará a salvação.
-O Espírito Santo não somente convence o homem de que ele é um pecador, mas, também, de que Jesus é o Salvador.
Por isso, o apóstolo Paulo diz que a salvação vem pela confissão ao Senhor Jesus e na crença no coração de que Deus
O ressuscitou dos mortos (Rm.10:9). A confissão dos pecados é feita ao Senhor Jesus, pois, assim, o homem admite que é pecador e que Jesus é o Salvador, o único que pode libertá-lo do pecado, um Jesus histórico, um Jesus que, sendo Deus, fez-Se homem, morreu em nosso lugar e ressuscitou dos mortos. Se cremos assim, somos salvos. Aleluia!
-A fé em Jesus como sendo o Salvador mostra que a fé é “o firme fundamento das coisas que se esperam e a prova das coisas que não se veem” (Hb.11:1), pois Jesus já não está mais fisicamente entre nós e, portanto, não adianta querermos “ver para crer”, como fez Tomé. Por isso mesmo, o Senhor Jesus disse que são “bem- aventurados os que não viram e creram” (Jo.20:29).
Vemos, assim, como é diferente a fé salvífica da fé que andam pregando por aí, uma “fé inteligente”, que depende de ver milagres e situações para se desenvolver…
-O Espírito Santo, por fim, convence do juízo, ou seja, convence o homem de que quem não crer em Jesus está irremediavelmente condenado, como condenado já foi o diabo, o príncipe deste mundo.
O Espírito Santo mostra que não há solução para o homem senão em Jesus e que quem não aceitá-l’O estará irremediavelmente perdido, assim como o diabo. Quando somos convencidos de que o diabo já está condenado, não mais seguimos as suas sugestões, tornamo-nos impermeáveis às suas tentações, deixamos de crer nele para crermos no Senhor.
-Este convencimento do Espírito Santo é exatamente o oposto do que ocorreu no dia da queda, quando houve um convencimento do diabo ao primeiro casal (Gn.3:1-6). Naquela oportunidade, o homem foi convencido pelo diabo que não havia problema em desobedecer a Deus, de que Deus não falava a verdade e de que era possível viver-se independentemente de Deus e o resultado foi a prática do pecado e a morte espiritual.
-Quando o homem é convencido pelo Espírito Santo, reconhece-se um pecador e que Jesus é o Salvador e, por isso, confessa que é um pecador e que Jesus é o Salvador, crendo que Ele morreu por nós e ressuscitou dos mortos e, então, se arrepende, “muda de mentalidade”, decide obedecer a Deus e a viver de acordo com a Sua vontade. Dá-se, então, a primeira participação humana no processo da salvação.
-Muito se discute, entre os teólogos, se a fé vem antes do arrependimento ou o arrependimento se segue à fé, mas tal discussão esquece um ponto importantíssimo, que é, precisamente, o convencimento do Espírito Santo.
A fé é trazida pela Palavra e o Espírito Santo atua para que o homem seja convencido e, neste convencimento, opera-se o arrependimento que Paulo muito bem diz ser consequência da “tristeza segundo Deus” (II Co.7:10).
-Fé e arrependimento se amalgamam, misturam-se, sendo como que dois lados da mesma moeda. Como afirma Sinclair Ferguson: “…John Murray insistiu que essa questão levanta:… uma pergunta desnecessária e a insistência fútil de que uma precede à outra. Não há prioridade.
A fé que é para a salvação é uma fé penitente, e o arrependimento que é para a vida é um arrependimento crente […] fé salvífica é permeada de arrependimento, e arrependimento é permeado de fé salvífica. (Redemption — Accomplished and Applied, p. 113).
Essa é, certamente, a perspectiva mais bíblica. Não podemos separar o desviar-se do pecado em arrependimento e o converter-se a Cristo em fé. Ambos descrevem a mesma pessoa na mesma ação, mas a partir de perspectivas diferentes. Sob um ângulo (arrependimento), a pessoa é vista em relação ao pecado; de outro (fé), a pessoa é vista em relação ao Senhor Jesus. Mas o indivíduo que simultaneamente confia em Cristo se desvia do pecado.
Ao crer, ele se arrepende, e ao arrepender-se, ele crê. Talvez R. L. Dabney expresse isso melhor quando ele diz que arrependimento e fé são graças “gêmeas” (talvez possamos dizer “gêmeas siamesas”).…” (Fé e arrependimento: o que vem primeiro? Trad. de Alan Cristie. Disponível em: http://www.ministeriofiel.com.br/artigos/detalhes/673/Fe_ou_Arrependimento_o_que_vem_primeiro Acesso em 19 ago. 2017).
-Faz-se necessário que o homem assuma a sua condição pecaminosa. É preciso ser convencido do pecado, ou seja, o homem precisa reconhecer que é um pecador, que desobedece a Deus e que deve servi-l’O. Este gesto somente será tomado se a pessoa atender ao Espírito de Deus, se abrir o seu coração a Deus e permitir que Ele faça morada (Jo.14:23).
-Este reconhecimento de que se é pecador e que é preciso mudar seu comportamento diante de Deus é o arrependimento, que é o quinto ato do processo da salvação, mas o primeiro que depende única e exclusivamente do homem.
Até aqui todo o processo da salvação tem nascimento em Deus e d’Ele depende exclusivamente (eleição, predestinação, vocação, fé e convencimento), mas, quando chegamos ao arrependimento, vemos que este ato é exclusivo do homem.
É por este motivo que todos não serão salvos, pois a salvação não depende exclusivamente de Deus, mas tem participação humana, que é a apropriação da fé e, consequentemente, o reconhecimento de que se é um pecador e que se precisa de um Salvador.
-O arrependimento é o que devemos proclamar. Jesus, ao iniciar a pregação do Evangelho, não tinha outra mensagem senão “Arrependei-vos e crede no Evangelho” (Mc.1:15 “in fine”).
A palavra grega para “arrependimento” é “metanoia” (μεταυοια), cujo significado é “mudança de mentalidade”, “mudança de pensamento”, “mudança de atitude”. O arrependimento, pois, envolve uma modificação de desejos, ações e concepções de vida. Não é possível uma salvação sem arrependimento. Não é possível uma salvação com base em emoções passageiras. Não é possível uma salvação em que as pessoas continuam a praticar as mesmas coisas do passado.
-Por isso, devemos diferenciar entre arrependimento e remorso. O remorso é, assim como o arrependimento, uma tristeza que vem ao homem por causa de atos praticados. Entretanto, enquanto o arrependimento gera
uma mudança de atitudes, o remorso é tão somente esta tristeza, sem qualquer mudança de comportamento. O remorso é incapaz de gerar salvação, como nos mostram os exemplos bíblicos de Caim (Gn.4:13,14), Esaú (Hb.12:7), Faraó ( Ex.10:16,17) e Judas Iscariotes (Mt.27:3-5).
-O arrependimento é um ato voluntário do homem, possível por causa da graça preveniente, mas realmente um ato do homem.
Por isso, totalmente sem fundamento a ideia de que o arrependimento é tão somente uma imposição divina a quem está predestinado a ser salvo, como entendem os seguidores da doutrina da predestinação incondicional. Paulo mesmo diz isto ao afirmar que não são todos os que obedecem e que o profeta, inclusive, indagou: Quem creu na nossa pregação? (Rm.10:16).
-Com propriedade assim define arrependimento o teólogo e pastor norte-americano Charles Finney (1792- 1895), o grande nome do Segundo Avivamento Norte-Americano: “…”dar uma segunda olhada”, ou falando mais estritamente, mudar a mente da pessoa como consequência de se conformar a uma segunda visão mais racional do assunto.
Esta palavra expressa evidentemente uma mudança de escolha, propósito, intenção em conformidade com as injunções da inteligência. Sem dúvida esta é a ideia do arrependimento evangélico. É um fenômeno da vontade e consiste na mudança da intenção última do egoísmo para a benevolência.
O termo expressa o ato da mudança do coração ou da preferência governante da alma. Pode com propriedade ser traduzido pelos termos “mudando o coração”.…” (Teologia sistemática. Trad. de Lucy Iamakami, Luís Aron de Macedo e Degmar Ribas Júnior. 3. ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2004, pp.378-9).
-É preciso crer e, quem crê, arrepende-se de seus pecados, ou seja, muda de vida, altera o seu “modus vivendi”. Por isso, não se pode admitir a salvação de quem continua a viver da mesma maneira e achar que está salva apenas porque “levantou a mão” num apelo ou fez confissão pública e oral de seus pecados.
-A técnica do “apelo”, generalizada por Charles Finney (1792-1895), bem como a prática da confissão pública e oral dos pecados na oração em que se pede perdão dos pecados são iniciativas com base bíblica e devem ser cultivadas, mas não pensemos que tais condutas são “mágicas”, “geram a salvação”.
O que gera a salvação é a fé em Cristo Jesus, o convencimento do Espírito Santo e o consequente arrependimento dos pecados, arrependimento este que será demonstrado pelo fruto da justiça que se produzirá desde então, pois, como ensina Karl Barth,
“…[Obediência significa] estar pronto a abrir mão de tudo ‘isto e aquilo’, do ‘aqui e acolá’ em que estamos envolvidos; [obedecer significa] estar disposto a abandonar empreendimentos, mudar de hábitos de trabalho, romper compromissos, afastar-se de ligações [alianças ou associações e, por que não? em casos extremos, romper até mesmo os laços de família…];
significa rejeitar [ou aceitar] riscos; deixar que o pêndulo que oscila repouse em seu ponto morto e também permitir que oscile de um ponto ao outro, percorrendo sempre de novo o mesmo caminho, para frente e para trás, sem jamais repousar; (obedecer, significa enfrentar a vida com constante e igual seriedade (e responsabilidade), qualquer que seja o ponto de nosso percurso, a situação em que nos encontremos;
significa suportar os golpes que Deus nos enviar em toda sua amplitude, (sabendo em quem temos crido!), jamais esquecendo, nem perdendo a noção de que, em Deus, todas as coisas estão sujeitas ao PARE! divino [e que todas as coisas concorrem, conjuntamente, para o bem daqueles que amam a Deus!].…” (Carta aos romanos. Trad. de Lindolfo Anders. São Paulo: Fonte Editorial, 2008, p.597).
IV – A CONFISSÃO E O ABANDONO DO PECADO
-O arrependimento tem seu ponto de partida na confissão. Como diz o apóstolo João: “se confessarmos os nossos pecados, Ele é fiel e justo para nos perdoar os nossos pecados e nos purificar de toda a injustiça” (I Jo.1:9).
-Neste texto, a palavra “confessar” é a palavra grega “homologeo” (ὁμολογέω), “…assentir, i.e., fazer concerto, reconhecer:—confessar, professar, confissão é feita, dar graças, prometer.
De homologos, assentir, que se origina de homou, juntamente com, e logos, palavra. Falar ou dizer a mesma coisa que outra pessoa, por exemplo, dizer as mesmas coisas, i.e., assentir, concordar, concordar com…” (Bíblia de Estudo Palavras- Chave. Dicionário do Novo Testamento, verbete 3670, p.2322).
-Confessar é, portanto, dizer a mesma coisa e, no caso que estamos a tratar, é dizer que se é pecador, reconhecer-se pecador, assumir a sua condição de malfeitor e merecedor da condenação eterna, admitir-se que se está errado e que se está a desobedecer a Deus.
-Tem-se, pois, que a confissão envolve um assentimento intelectual, uma consideração racional de que corresponde à realidade a afirmação de que se pecou, se está na prática do pecado, que se está errado. Mas a confissão não pode se circunscrever a isto, pois a salvação não vem pelo mero convencimento do pecado, mas, também, exige o convencimento da justiça e do juízo (Jo.16:8).
-É interessante observar que, segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, a palavra “confessar” em latim “confessio, onis”, é tradução da palavra grega “homologeo”, com sentido de “reconhecimento”.
-A necessidade de confissão também nos é apresentada no episódio de Acã, aquele que desobedeceu ao Senhor e tomou parte do anátema de Jericó. Uma vez descoberto seu pecado, Josué conclamou Acã a que “fizesse confissão” (Js.7:19).
-A palavra hebraica aqui é “todhah” (דה תֹו), “…(propriamente) um estender da mão, i.e., (por implicação) confissão, ou (normalmente) adoração; especificamente um coro de adoradores:— confissão, (sacrifício de, oferta de, render) louvor, (sacríficio de, oferta de) ação de graças, agradecimento…” (Bíblia de Estudo Palavras-Chave. Dicionário do Antigo Testamento, verbete 8426, p.1998).
-Aqui o sentido é de submissão à vontade divina, reconhecimento do senhorio de Deus e de que o que estamos a fazer é uma violação de uma ordem do Criador e que devemos, então, nos render a Ele, entregarmo-nos como guerreiros vencidos diante das tropas vencedoras, ficarmos à Sua mercê.
-Em Ed.10:1, é dito que Esdras, diante do pecado praticado por grande parte dos judeus de se casar com mulheres gentias, “fez confissão” e aqui a palavra empregada é “yadhah” (֔תֹו ֹּד ַו ְת ִה ְ֨כ ּו), “…(literal) usar (i.e., estender) a mão; (fisicamente) arremessar (uma pedra, uma flecha); especialmente reverenciar ou adorar (com mãos estendidas); (intensivo) lamentar (torcendo as mãos) …” (Bíblia de Estudo Palavras-Chave. Dicionário do Antigo Testamento, verbete 3034, p.1674).
-Basicamente, é o mesmo significado do texto anterior, ainda que se possa ter aqui adicionada a ideia de lamento, aquela “tristeza segundo Deus” que caracteriza o arrependimento que opera a salvação (II Co.7:10).
-Sendo a confissão, portanto, este assentimento, esta concordância, evidentemente que não se tem apenas um assentimento intelectual, pois a fé salvadora é sobrenatural, não se trata de mero exercício de raciocínio.
-Pois bem, para vermos como tem de ser esta confissão de pecados, iremos nos basear em conhecido sermão do príncipe dos pregadores britânicos, Charles Haddon Spurgeon (1834-1892), chamado “Confissão de pecado – um sermão em sete textos” que, entre outros endereços na internet, pode ser encontrado em https://www.monergismo.com/textos/chspurgeon/confissao_pecado_spurgeon.htm#:~:text=A%20menos%2 0que%20haja%20uma,que%20n%C3%A3o%20confessar%20seus%20pecados%20.
-Spurgeon começa seu sermão afirmando que “…isto [confissão de pecado] é absolutamente necessário à salvação. A menos que haja uma verdadeira e sincera confissão de nossos pecados a Deus, não temos nenhuma promessa que nós acharemos clemência no sangue do Redentor. “Todo aquele que confessar seus pecados e
os abandonar achará misericórdia”. Mas não há nenhuma promessa na Bíblia para o homem que não confessar seus pecados.…” (end. cit. Acesso em 26 fev. 2024).
-Entretanto, irá afirmar, logo em seguida (e o demonstrará ao longo do mencionado sermão): “…Há muitos que fazem uma confissão, e uma confissão diante de Deus, e não recebem nenhuma bênção, porque a confissão deles não tem certas marcas que são requeridas por Deus, que provariam sua genuinidade e sinceridade e que demonstrariam terem sido fruto do trabalho do Espírito Santo.
Meu texto esta manhã consiste em duas palavras: “eu pequei”. E você verá como estas palavras, nos lábios de homens diferentes, indicam sentimentos muito diferentes. Enquanto uma pessoa diz “eu pequei” e recebe perdão, outro diz o mesmo, porém segue seu caminho para se enegrecer com pecados piores que antes e mergulha em profundezas maiores de pecado do que antes ele tinha experimentado.…” (ibid.).
-Como se pode perceber, a confissão de pecados não é apenas o reconhecimento de que se está errado, mas uma demonstração de que se tem disposição para mudança de atitude, crê-se que não se pode continuar a desobedecer a Deus e que se deve render a Ele.
A confissão eficaz é aquele em que se tem além do reconhecimento do erro, a constatação de que é preciso mudança de atitude e que isto será possível se passarmos a fazer a vontade de Deus, exatamente o contrário do que estamos a fazer.
-A confissão nada mais é que o uso da boca para invocar o nome do Senhor e alcançar a salvação, como bem disse o apóstolo Paulo: “Visto que com o coração se crê para a justiça e com a boca se faz confissão para a salvação” (Rm.10:10).
-A confissão é fruto da fé. Primeiro, a pessoa crê na palavra da verdade e, em seguida, confessa o seu pecado, não só reconhecendo o erro, mas sabendo que somente se salvará se mudar de atitude e passar a fazer o que Deus quer e manda.
-Bem, por isso, no já mencionado sermão, Spurgeon analisa sete confissões que se consubstanciam na frase “eu pequei”, mas confissões que foram inócuas para a salvação, precisamente porque não foram expressões de quem creu, convencido pelo Espírito Santo, mas apenas reconheceu que havia errado.
-O primeiro caso é o de Faraó, o Faraó da época da libertação do povo hebreu do Egito, que, embora tenha dito ter pecado (Ex.9:27), não se rendeu ao Senhor, antes endureceu o seu coração seguidamente, a ponto de o próprio Deus, num determinado instante, ter endurecido ainda mais o coração de Faraó. O resultado desta confissão ineficaz foi a morte de Faraó, afogado que foi nas águas do Mar Vermelho.
-O segundo caso é o de Balaão, que, embora tenha dito ter pecado (Nm.22:34), manteve em seu coração o desejo do prêmio da injustiça (Cf. Jd.11) e, assim que o Senhor lhe permitiu ir ao encontro de Balaque, lançou- se alucinadamente para obter as riquezas, a ponto de, mesmo depois de ter abençoado Israel em vez de amaldiçoá-lo, ter dado conselhos malignos para causar prejuízo aos israelitas (Nm.31:16).
Trata-se do “homem dúbio”, como o denominou Spurgeon, porque está sempre a balançar entre o bem e o mal, precisamente porque não tem fé e é como a onda do mar (Cf. Tg.1:6).
-O terceiro caso é o de Saul, que embora tenha dito ter pecado (I Sm.15:24), esta sua fala não correspondeu ao seu sentimento, pois achou que havia feito o certo e que o Senhor é que estava errado. Bem por isso o príncipe dos pregadores britânicos disse ser este o caso do “homem insincero”, ou seja, aquele que, embora admita ter errado na sua fala, em seu coração mantém o pensamento de que não cometeu erro algum.
-O quarto caso é o de Acã, que embora tenha dito ter pecado (Js.7:20), não deu glória a Deus, como mandou Josué, limitando-se a contar o seu pecado, com detalhes, mas não pronunciando qualquer sinal de arrependimento nem de submissão a Deus. Spurgeon o denomina “o penitente duvidoso”, ou seja, aquele que se limita a reconhecer o erro mas não demonstra rendição a Deus.
-O quinto caso é o de Judas Iscariotes, que, embora tenha dito ter pecado (Mt.27:4), tornou-se o filho da perdição (Jo.17:12). Spurgeon chama a atitude do apóstolo traidor de “arrependimento de desespero”, mas, em verdade, não houve arrependimento, mas, sim, remorso. Judas não creu que Jesus pudesse perdoá-lo, não creu que o Senhor ainda o via como “amigo” (Mt.26:50).
-Ao perceber que havia traído o seu Mestre, Judas, em vez de ir até o Senhor e Lhe pedir perdão, foi, como costuma afirmar o pastor José Serafim de Oliveira, “bater em porta errada”, confessando o seu pecado aos principais dos sacerdotes e aos anciãos (Mt.27:3,4) e, desesperado, foi-se enforcar (Mt.27:5).
-Temos aqui um caso de “remorso”, que, segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, é o “sentimento de culpa e arrependimento causados pela consciência de haver praticado más ações”, é o “remordimento”, ou seja, “o tornar a morder”.
É a pessoa que se sente culpada, mas não crê que possa ter mudada a situação, que se conforma com a sua condição de pessoa errada e, assim, sem fé, passa a ter um desespero, uma desesperança, aceitando a morte, seja ela espiritual, seja ela até física, como ocorreu com Judas Iscariotes.
-Daí ter o apóstolo Paulo dito que “a tristeza do mundo opera a morte” (II Co.7:10). A confissão de pecado acompanhada da descrença do perdão traz o desespero e leva o homem à perdição. Foi o que aconteceu com Caim que, não crendo que Deus lhe pudesse perdoar (Gn.4:13), saiu da presença do Senhor (Gnj.4:16) e se tornou uma pessoa do maligno (I Jo.3:12)..
-O sexto caso é o do patriarca Jó (Jó 7:20). Na verdade, aqui, Jó ainda não tinha consciência de que havia pecado. Diante da terrível provação e sendo acusado por seus amigos, Jó clama a Deus e diz: “se pequei, que Te farei, ó Guarda dos homens”.
-O próprio Spurgeon, em outro sermão, mostra-nos que Jó não havia pecado, mas o Senhor permitiu aquela provação para livrá-lo de uma tendência para a autoexaltação e, ao término de sua prova, o próprio patriarca pediu perdão por não ter se aproximado ainda mais do Senhor (Jó 42:6).
OBS: “…Somos pobres criaturas para criticar um homem como Jó – mas ainda havia nele apenas uma pitada de farisaísmo. Acho que, e seus amigos trouxeram à tona, Elifaz e Zofar disseram coisas tão irritantes que o pobre Jó não pôde deixar de responder em termos fortes sobre si mesmo que eram fortes demais, pode-se pensar; havia uma justificativa um pouco demasiada.
Ele não tinha orgulho, como alguns de nós, de muito pouco – ele tinha muito do que se orgulhar, como o mundo permitiria -, mas ainda assim havia a tendência de se exaltar com isso e, embora o diabo não soubesse, talvez se ele tivesse deixado Jó sozinho, esse orgulho poderia ter germinado, e Jó poderia ter pecado; mas ele estava com tanta pressa que não permitiu que a semente doente amadurecesse, mas apressou-se em cortá-la, e, deste modo, foi a ferramenta do Senhor para levar Jó a um estado de espírito mais humilde e, consequentemente, mais seguro e abençoado.
Além disso, observe como Satanás foi um lacaio para o Todo-Poderoso! Jó todo esse tempo estava sendo habilitado para ganhar uma recompensa maior.…” (Satanás considerando os santos – um sermão de Charles Spurgeon. Disponível em: https://adivalparaiso.org/jo-apendice-01-satanas-considerando-os-santos-um-sermao-de-charles-spurgeon/ Acesso em 27 fev. 2024).
-Neste caso, portanto, é uma confissão eficaz, porque Jó cria que Deus poderia perdoá-lo, numa atitude diametralmente oposta a de Judas Iscariotes ou de Caim, e, mesmo sem saber o que havia cometido de errado (como o salmista na sua expressão no Sl.139:23,24), reconhecendo a soberania divina, põe-se à disposição para ser conscientizado de seu erro e, assim, poder pedir perdão ao Senhor e fazer-Lhe a vontade.
-Bem por isso o príncipe dos pregadores britânicos chamou este episódio de “arrependimento do santo”, porque Jó confessa a sua condição pecaminosa, mesmo sem ter consciência do que havia feito de errado, porque tinha uma natureza santa, buscava viver apartado do pecado.
-O último caso abordado por Charles Spurgeon no mencionado sermão é o do filho pródigo, que, ao ter desejado comer a própria comida dos porcos, admite ter pecado (Lv.15:18) e decide retornar e pedir perdão ao seu pai, mesmo sabendo que não tinha mais dignidade de filho.
Esta atitude é chamada, no sermão, de “confissão abençoada”, precisamente porque, tendo ido ao “lugar certo”, a confissão foi acompanhada de uma atitude de fé, pois o filho confiava no perdão do pai, tendo havido uma “tristeza segundo Deus”, já que houve uma mudança de atitude, um verdadeiro e genuíno arrependimento. O filho deixa o mundo e volta à casa do pai, de onde havia saído.
-Esta é a confissão que reproduz, na boca, uma crença do coração, uma confissão que vem acompanhada do abandono do pecado, de uma conversão, ou seja, mudança de direção.
Aliás, alguém já disse que, se o arrependimento é uma atitude interna, que está no coração do homem e que, portanto, só pelo Senhor pode ser observada (Cf. I Sm.16:7), a conversão é a face externa desta mudança, visto que há uma modificação de comportamento e de conduta, perceptível por todos os semelhantes (Mt.7:16-20). Daí o teor da pregação do Evangelho: “arrependei-vos e convertei-vos” (At.3:19).
-A misericórdia divina somente é alcançada quando há esta confissão acompanhada de fé e esperança, que nos leva ao abandono do pecado passado e à disposição de não mais pecar (Pv.28:13). Não basta a descoberta da transgressão, mas precisa haver o desejo de mudança de atitude, é preciso termos a “mudança de mentalidade”, que nada mais é que o arrependimento.
-A palavra “deixa” em Pv.28:13 é a palavra hebraica “azabh” (זֵ֣ב ֹּע ְו ), “…soltar, i.e., abandonar, permitir etc.:— encomendar-se, entregar-se, deixar, abandonar, desamparar, ajudar, retirar, mudar, dar de mão (…).
A palavra pode ser usada para designar a partida para um novo local (II Rs.8:6); ou para separar-se de outra pessoa (Gn.44:22; Rt.1:16) …” (Bíblia de Estudo Palavras-Chave. Dicionário do Antigo Testamento, verbete 5800, p.1834).
-Notemos, pois, que a confissão deve vir acompanhada de uma “mudança de local”, de “uma soltura”, de uma “separação”.
Não basta reconhecer que se está errado, mas é necessário sair do mundo, como, para falar da feliz alegoria de Bunyan, fez Cristão que resolveu abandonar a Cidade da Destruição.
-É preciso “soltar-se”, ou seja, querer ficar livre do “fardo de pecado” e dos “trapos de imundície” (uma vez mais se recordando de “O peregrino”), desfrutando da libertação do pecado operada por Cristo (Jo.8:36).
– Por fim, torna-se indispensável a “separação”, ou seja, impõe-se que nos separemos do pecado e do príncipe deste
Pr. Caramuru Afonso Francisco
Fonte: https://www.portalebd.org.br/classes/adultos/10522-licao-8-confessando-e-abandonando-o-pecado-i